domingo, 26 de agosto de 2007

Sobre rosas e margaridas

Certa vez eu percebi margaridas abandonadas no estacionamento do prédio, passei por elas em silêncio, é essa coisa minha de respeito. E foi assim por uma semana seguida, eu saía e chegava e lá estavam as margaridas.

Hoje eu vi as rosas da vizinha na lixeira. Eu parei, olhei e surtei.

Rosa nunca foi minha flor preferida, não tiro a razão de quem jogou o que fora e digo mais, todo mundo deve ter uma razão - boa ou ruim - para se jogar rosas no lixo e margaridas no estacionamento, todo mundo deve ter um motivo para colocar coisas na lixeira, na gaveta ou na mochila, mas me explica o que as coitadas das rosas e margaridas teem a ver com toda essa coisa de amar e ser amado?

De fato, pra que tudo isso? De que adianta as falácias melodramáticas, as juras, as choradeiras, as músicas, o sexo, o amor mal-resolvido, as margaridas no estacionamento e as rosas na lixeira? Quem foi o infeliz que um dia chegou a achar que tudo na vida é flores? Hein? Idiotice romântica achar que alguém comprará as minhas se eu morrer de amores...

Por isso amigas, na lápide eu quero: "Plantem árvores e economizem água, deixem as flores em seus respectivos refúgios, para quem realmente sabe o que fazer com elas. Obrigada."

Se as rosas e as margaridas eram desses casos de quando a pessoa é bem/mal amada eu não sei, só sei que é por isso que eu não paro nem olho mais.

Não vejo mas também não surto...
Amém.


S.

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

Caro amigo G.


Estava sem tempo para lhe escrever, mas hoje senti uma falta tão grande daquelas nossas conversas demoradas de cinzeiro cheio e resolvi ouvir o barulho das teclas velhas da minha máquina de escrever.
Por aqui não chove faz quase meio ano, mas também não é muito quente, existe um frio de vento gelado no final da tarde que é uma delícia.
A vista do meu novo quarto dá de frente para uma imensidão de grama verde. Tenho acordado com o barulho das águas que beira o sítio do vizinho e o sol brilhando feito nossos olhos naquele tempo de dezessete.
Tenho tantas saudades quando olho para o céu. Às vezes confundo-o com o mar de tão azul, de tão infinito, é o céu mais celeste que já vi. Limpo, só azul. Tem dias que me arde os olhos de tanto que fico olhando, olhando e olhando. Mas isso só acontece nos dias da semana, porque a partir das sextas-feiras, ele é completado por arranhados brancos, como uma pintura, mas as únicas tintas são as nuvens que não formam desenhos. Tudo se torna um único quadro.
Sabe, por mais que a natureza grite durante o dia, tenho preferido, como nunca fiz, o céu durante à noite. Todo escuro e brilhante de estrelas. Seu Lourenço, que mora perto da Rua das Magnólias, me disse que aqui é o único lugar da redondeza que tem vista para todas as estrelas. Todinhas. De vez em quando ele me empresta um telescópio velho, porém encantador, para que eu possa ficar olhando elas, mesmo sem saber o nome da maioria.
Depois do trabalho, quando chego aqui em casa, tomo um banho, pego algumas frutas que dona Augusta deixa na bacia que fica na mesinha da varanda, e sem perder mais nenhum minuto, vou de bicicleta ao lugar mais alto que fica a uns dez minutos daqui. Estendo o último presente da minha avó, uma toalha florida, que cabe certinho em baixo do pé de laranja. Fico lendo Oswald de Andrade, ou então engolindo Guimarães Rosa até me perder.
Quando estaciono a leitura, a escuridão tomou conta à minha frente, e a lua clareia minhas costas, quase que lavando meus cabelos que se mexem iguais às folhas nos galhos da árvore. Sempre me aperto de saudade olhando tudo isso acontecendo comigo, lembrando nossos dias, nossos sonhos que com o tempo perderam a respiração.
Qualquer dia desses apareço por aí, no Rio de Janeiro, para lhe fazer uma visita e roubar muitos sorrisos e abraços. Mande-me noticias, ou então faça-me uma visita também.

Cuide-se amigo, pois aqui eu cuido dos girassóis como se fossem seus cachos caindo em cima da orelha fria.


Um beijo saudoso de final de outono.

C.