sábado, 15 de setembro de 2007

Doce-mel amargo

É mel que corre pelas minhas veias. De um doce tão doce que num súbito se conhece veneno.
Entontece e depois afasta.
Sou a pura flor intacta do meu eu.
Mas a carne viscosa do meu fruto só escorre mel sete dias depois que alguém já o mordeu.

L.

domingo, 26 de agosto de 2007

Sobre rosas e margaridas

Certa vez eu percebi margaridas abandonadas no estacionamento do prédio, passei por elas em silêncio, é essa coisa minha de respeito. E foi assim por uma semana seguida, eu saía e chegava e lá estavam as margaridas.

Hoje eu vi as rosas da vizinha na lixeira. Eu parei, olhei e surtei.

Rosa nunca foi minha flor preferida, não tiro a razão de quem jogou o que fora e digo mais, todo mundo deve ter uma razão - boa ou ruim - para se jogar rosas no lixo e margaridas no estacionamento, todo mundo deve ter um motivo para colocar coisas na lixeira, na gaveta ou na mochila, mas me explica o que as coitadas das rosas e margaridas teem a ver com toda essa coisa de amar e ser amado?

De fato, pra que tudo isso? De que adianta as falácias melodramáticas, as juras, as choradeiras, as músicas, o sexo, o amor mal-resolvido, as margaridas no estacionamento e as rosas na lixeira? Quem foi o infeliz que um dia chegou a achar que tudo na vida é flores? Hein? Idiotice romântica achar que alguém comprará as minhas se eu morrer de amores...

Por isso amigas, na lápide eu quero: "Plantem árvores e economizem água, deixem as flores em seus respectivos refúgios, para quem realmente sabe o que fazer com elas. Obrigada."

Se as rosas e as margaridas eram desses casos de quando a pessoa é bem/mal amada eu não sei, só sei que é por isso que eu não paro nem olho mais.

Não vejo mas também não surto...
Amém.


S.

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

Caro amigo G.


Estava sem tempo para lhe escrever, mas hoje senti uma falta tão grande daquelas nossas conversas demoradas de cinzeiro cheio e resolvi ouvir o barulho das teclas velhas da minha máquina de escrever.
Por aqui não chove faz quase meio ano, mas também não é muito quente, existe um frio de vento gelado no final da tarde que é uma delícia.
A vista do meu novo quarto dá de frente para uma imensidão de grama verde. Tenho acordado com o barulho das águas que beira o sítio do vizinho e o sol brilhando feito nossos olhos naquele tempo de dezessete.
Tenho tantas saudades quando olho para o céu. Às vezes confundo-o com o mar de tão azul, de tão infinito, é o céu mais celeste que já vi. Limpo, só azul. Tem dias que me arde os olhos de tanto que fico olhando, olhando e olhando. Mas isso só acontece nos dias da semana, porque a partir das sextas-feiras, ele é completado por arranhados brancos, como uma pintura, mas as únicas tintas são as nuvens que não formam desenhos. Tudo se torna um único quadro.
Sabe, por mais que a natureza grite durante o dia, tenho preferido, como nunca fiz, o céu durante à noite. Todo escuro e brilhante de estrelas. Seu Lourenço, que mora perto da Rua das Magnólias, me disse que aqui é o único lugar da redondeza que tem vista para todas as estrelas. Todinhas. De vez em quando ele me empresta um telescópio velho, porém encantador, para que eu possa ficar olhando elas, mesmo sem saber o nome da maioria.
Depois do trabalho, quando chego aqui em casa, tomo um banho, pego algumas frutas que dona Augusta deixa na bacia que fica na mesinha da varanda, e sem perder mais nenhum minuto, vou de bicicleta ao lugar mais alto que fica a uns dez minutos daqui. Estendo o último presente da minha avó, uma toalha florida, que cabe certinho em baixo do pé de laranja. Fico lendo Oswald de Andrade, ou então engolindo Guimarães Rosa até me perder.
Quando estaciono a leitura, a escuridão tomou conta à minha frente, e a lua clareia minhas costas, quase que lavando meus cabelos que se mexem iguais às folhas nos galhos da árvore. Sempre me aperto de saudade olhando tudo isso acontecendo comigo, lembrando nossos dias, nossos sonhos que com o tempo perderam a respiração.
Qualquer dia desses apareço por aí, no Rio de Janeiro, para lhe fazer uma visita e roubar muitos sorrisos e abraços. Mande-me noticias, ou então faça-me uma visita também.

Cuide-se amigo, pois aqui eu cuido dos girassóis como se fossem seus cachos caindo em cima da orelha fria.


Um beijo saudoso de final de outono.

C.

domingo, 29 de julho de 2007



Seca, como as secas folhas que caem durante o outono. Mas não deixe tudo isso escoar. Aqueça, esfrie e renove a cada dia todo esse amor.

D.

domingo, 1 de julho de 2007

samba dobrado

Você parou bem na minha frente, tampando a luz que vinha forte clareando meu rosto. Nós nos olhamos fixamente por uns bons minutos, e eu tinha vontade de gritar para o mundo como eu te desejava toda vez que aquele pé de galinha franzia disfarçando o sorriso. Mãos levemente tocadas, até que nossa respiração se encontrou, a gente dançou entre nuvens em forma de beijo, a gente se apertava de saudade do que ainda não tinha sido, eu sentia tuas mãos puxando meus cabelos, e ouvia minha perna tremer bamba por você. Eu não escutei sinos não, o que explodiu nos meus ouvidos fora um samba dobrado cheinho de todos os instrumentos. A gente sambava enquanto às luzes pintavam aquele branco preenchido de cabeças na sala da festa. Você parou na minha frente e me beijou a mão, pensei bobagem e quis dizer que te amo.

C.

terça-feira, 26 de junho de 2007

telenovelamexicana. dois meses depois que tudo começou eu escrevi dizendo o quanto valia a pena. eu tinha tanta certeza daquilo, eu acreditava em cada palavra. era tudo o que eu tinha, o que me fazia sorrir: sentar, escrever, sonhar, sonhar, letras, música. sentar de novo, escrever mais uma vez, sentir por todos os dias e nunca acordar do sonho. valeu a pena. hoje não faço idéia do que isso tudo significa. de repente as letras formam outras palavras, os sonhos só vêm e vêem a noite e gritos anti-musicais. respeito tudo isso quase religiosamente. foi um ciclo, foi o ciclo. ciclo de um quadrado sem uma das arestas que definitivamente o fim não foi o começo, nem se sabe qual fim foi. algo como uma linha alternativa de algum cineasta maluco. um filme caseiro, que nunca foi produzido, que distribuidora nenhuma quis veicular. que está empoeirado na última prateleira empoeirada de algum lugar. um filme de trajetória não-linear, como o quadrado sem aresta. já quis muito, muito, um bocado, fazer esse quadrado virar um hexaoctagomilexágono. sem fim. até a vida me embalar até o infinito e por lá eu ficar até tudo perder sentido. até. esse filme película 35mm tinha uma trilha sonora de embargar a voz, de levar para onde eu queria ir. era tudo o que queria: cozinha quadriculada, cerveja quase vencida, geladeira azul calcinha, cefé preto frio, carro com lataria velha e estofado de couro, bitucas pelo chão, televisão com o mesmo botão on/off e volume. vitrola, vinil, jazz e pérolas. eu queria uma vida preto-e-branco. acreditei tanto, tanto, um bocado. agora palavra-cruzada, colorindo, pintando. e o vermelho não é sangue, que bom... filme alternativo nenhum, de cineasta maluco nenhum, tem o óbvio fim. e é esse meu ritmo: ritmo da dor, da incerteza, do anti-lugar-comum. que leva para o infinito infinito infinito finitoin infinito infinito infinito infinito toinfini nifinito innifito infinito infinito. toinfinis homens. innifitos mulheres. nifinitos possibilidades. finitoin corpos no meu. e ainda te quis matematicamente 365 dias X 24 horas/dia do ano. e o porquê disso é o que faz as pessoas sairem do sala retrô do cine com tour descolorindo para colorir de novo. é o ñãõ-sei-o-que que me fez acreditar tanto e parar o tempo num sonho pitoresco. é esse ñãõ-sei-o-que que sopra pó mágico para assistir - sozinha- mais uma vez o filme e sair do cine com tour escondendo, não sei de quem, meus olhinhos pretinhos molhados de sal. e é assim, escrevendo, que as coisas que morrem em mim antes que eu diga são ditas. eu? eu continuo rodando, rodando, rodando para segurar as lágrimas desse choro inevitável. até que alguém me ponha no chão. até.

dó com baixo em dó

1. Seu medo passando pelas minhas narinas, disfarçando nos olhos claros cada pedaço desejado em um. Sorrindo por um canto amarelado e limpo.
2. E o outro olhar te desejava ileso e completamente ofensivo por ser um malandro amado, e um amante malandro. Amante pelos dedos longos, pelos seus pêlos loiros e os olhos brilhando cores que ainda não existem, mas sim, vão existir. Porque tudo há de existir para que possa acabar. Mas não, não agora. Nunca agora. As pernas indecisas e as mãos inquietas, palavras quase sombrias só para botar banca. E para que o medo do adeus estrale forte nesse seu coração macio.
3. É preciso conhecer essa dor aí, que eu conheci agora a pouco, mas é que tentamos nos enganar pelos laços que não são mais postos pelas mães, e sim, pelos negros que queremos ter.
4. Não é possível jogar qualquer um deles sem antes conhecer, seja roxa, verde ou alaranjado. Eles ainda existem. E não pense que não.
5. Porque o nosso suor quente sobre os dedos me adormecem para um sonho que vai além das palmas.
6. E o abraço quente exalado pelo frio do vento de março, apesar do inferno astral me disse que não é o fim.
7. Não pode e não deve acabar, ainda.

domingo, 17 de junho de 2007

De novo, amor.




Azuis, vermelhas, brancas flores. Pintando o cerro dos meus olhares fossem linda garoa em cores, molhando a tarde de ares solares chamam você, bem, não fique aí, vem molhar meu beijo, te beijo também.
D.

sábado, 16 de junho de 2007

Os opostos se distraem

Eu gosto quando você está perdida em um dos quatro cantos do meu quarto, sentada com a cabeça semi-baixa, me buscando com um olhar escondido por de trás da franja torta que despenca macia mostrando sua testa, eu resolvo te encarar, mas você desvia com um olhar sutil, fingindo não me enxergar. Eu também disfarço cantando assim, quase sem cantar pedacinhos do refrão de alguma música, mascando então o chicletes duro quase esquecido no canto da boca e você acaba sorrindo com aquele jeito de ganhar o mundo inteiro em dois segundos, e eu quase que manteiga, me derreto mais uma vez.

C.

quarta-feira, 6 de junho de 2007

esqueci os cálculos de novo

O receio de ver todo mundo me olhando, me encarando, me deduzindo - em formas que pelos olhos eu ainda não sei entender - era constante, e minhas mãos geladas do frio, suadas pelo nervoso, não parava de mexer no bolso da minha calça jeans velha. Meus pés cansaram de tanto bater, e de contrair os dedos dentro dos tênis limpos que usei só para a ocasião.
Meus dentes rangeram eternos intercalando com minha língua que não parava um só segundo, meu coração pulsava junto com os barulhos dos carros na rua - que a essa altura do campeonato, eu nem escutava mais - pensei na minha família, no meu objetivo de estar ali e no meu destino depois disso.
E todo mundo não parava de me olhar enquanto eu gaguejava e entortava palavras falhadas com os olhos quase embaçados de lágrimas. Um ritmo acelerado veio ao meu ouvido acompanhado por um "pííííííí" que me doloriu até franzir a testa, até tremer os lábios.
Me arrepiei inteira de medo, de ansiedade. Sentia a física quântica fazer efeito no meu cérebro e esqueci de qualquer Deus que existia dentro de mim por alguns segundos. Pensei que podia ser pecado não acreditar em alguma coisa suprema assim, e decidi esquecer os cálculos e voltar minha vida remota de castidade inversamente mentirosa.
O inverso da mentira, é a verdade - lembrei em pensamento - desfiz todos os meus pensamentos e refiz tudo de novo sem nem perceber. Até que os olhares me engoliram novamente junto com sorrisos traiçoeiros, cheios de maldade. Quando senti uma pontada no peito, e uma tontura me dominando segurei uma mão com a outra apertando até roxiar meus punhos.
Levantei, pedi licença e com o coração na boca, saí de cena novamente.

C.

segunda-feira, 4 de junho de 2007

Um parágrafo para alguém

Olhei pela janela e os carros passavam quase voando, ouvia barulho de buzinas e freadas fortes assustavam os pedestres que caminhavam longe, uns devagar outros completamente apressados, como o tempo que passava no meu relógio de pulso novo. O sol brilhava feito olhos que acabava de chorar, e o céu limpo trazia lembrança de algum carnaval fora de época, meio rosa, meio roxo, com tons lilases e tons púrpura levemente visíveis. Batia um vento gelado que era rapidamente esquentado pelos raios que vinham bem na minha direção queimando, me torrando a pele, cegando meus olhos e entorpecendo minha mente. Ouvi gritos de algum lado, me senti incomodada como se alguém estivesse me vigiando de algum canto. Fechei os olhos mais de uma vez, bocejei até meus olhos lacrimejarem, e voltei-me para trás, no meu quarto sombrio e quieto para uma segunda-feira agitada. Coloquei uma música alta, até que minha companheira de apartamento bater na minha porta para reclamar do barulho. Fingi diminuir, e continuei ali pensando no que fazer nesse dia cheio de coisas, mas sem nenhuma vontade. Abri o guarda-roupa não sei por que e fiquei minutos pensando em uma roupa para vestir, eu podia até pensar em andar a cidade toda, pensei em Curitiba, quis estar andando pela sete de abril, entrando no passado e sentindo o frio juntando com o sol, e mais tarde virar neblina, mas não quis sonhar demais, só queria me sentir bonita, como a tempos ninguém me via. Escolhi uma bem quentinha e neutra - como andava ultimamente - mudei de música, escovei meus dentes e a estranha sensação de alguém estar me vigiando ainda não havia passado. Coloquei meu all star azul velho já sem uma estrela do lado, peguei meu maço de cigarros e uma buzina de ônibus gritou pela cidade inteira. Corri e apareci na janela, e ao meio da multidão avistei você sorrindo por ter acabar de bater uma Combi de bolinhas brancas na traseira de um ônibus vermelho. Fechei os olhos devagar e desci como se nada tivesse visto só para você me contar do mesmo jeito que me contou em maio de uns anos atrás.


C.

Tácito eu

Teve uma hora que eu quis dizer tudo, aquela hora eu queria dizer tudo o que eu sempre quis te dizer e tudo o que eu sempre quis que você soubesse. Minha boca queria dizer frases, queria te embebedar nas minhas verdades e te entorpecer com os meus segredos, estava prestes a me denunciar quando seus olhares cúmplices compadeceram e fizeram sua boca insistir nos meus beijos, assim a minha só beijou e se calou pelo resto da noite.
Mas não pelo resto dos meus dias.

S.

Particular

Sento-me aqui para falar de minhas aflições, aflições estas que atormentam minha mente inexperiente. Palavras para descrever o quanto me apego as pequenas coisas e quanto isso me agoniza. Suspiros cheios de tremor, falta de ar. A dor chega ao ponto de quebrar tudo aquilo que estava lá dentro, que era chamado de bonito, mas que hoje se resume e se expressa no cotidiano, no vazio. Não entendo a meu ver o mundo que me engana, traiçoeiro, ganancioso, que me prega peças. Não sei lidar ainda com o novo, aquilo que foge a minha realidade, mas que ao mesmo tempo me desperta a curiosidade. Mas com o tempo, ao me descobrir, me adequo fácil a tais mudanças.
Os dias passam devagar, o vento insiste em aparecer, as folhas a cair, o clima é gelado. Arde de frieza a minha alma que esquenta ao receber as palavras mais remotas, um olhar penetrante, os mais simples gestos, um abraço apertado. A cabeça dói, acendo um cigarro para matar o tempo, o gosto amargo na boca, o café tira o sono, a música rola. Meus olhos transparecem a tristeza, nas olheiras o cansaço. Procuro uma música que encaixe em meus pensamentos, ouço aquela água com açúcar, a solidão me assusta. Procuro disfarçar soltando gargalhas, risos misturados com ar de ironia, inconstantes. Inconstante, essa é a palavra. Reflete a minha mudança de humor, de sentimentos , de sonhos perdidos. A cabeça começa a pesar, o sono vem vindo. A poesia surge espontaneamente como presente dos deuses , inspiração do inconsciente. Surge para retratar aquilo que é humano, particular. Aquilo que os olhos insistem em não contar e a razão demora a descobrir, a alma demora a transparecer... que agonia.
Calafrios, agitação, momento de sentir o coração na boca. Já não sei se aquilo que chamava de amor virou apenas cotidiano, carência. Dúvidas, paradoxos, complexos....confusão de sentimentos.


M.

domingo, 3 de junho de 2007

Leve saudosismo

"Nos despedimos deles e entramos, as portas se fecharam na nossa cara com toda a delicadeza do mundo, mas continuamos de pé, esperando aquele momento em que o trem partiria e as portas não se abririam mais.
Então nos sentamos e respiramos, vimos as paisagens mudarem rapidamente tarde da noite, e os flashes daquela cidade grande que dormia eram mais bonitos quando não tinha quase ninguém pra admirar.
Captávamos os pensamentos uma da outra, nos olhávamos e nos deleitávamos com o prazer de se morar por lá, de como éramos felizes e como nossas vidas dariam ótimos filmes. Jamais saberíamos o que viria pela frente, nem o quão maldita essas despedidas seriam. "


S.

sexta-feira, 1 de junho de 2007

Para a garota de blusa lilás

Ei gatora do cabelo curto
que balança a franja enquanto anda
cheira perfume que lembra lavanda,
para de brilhar os olhos olhando pra mim.
Garota com sotaque do sul
dança agachando e fazendo biquinho
só come pêssego e coisas que tem caldinho
morde alecrim e não mexe na bolsa se não for por mim.
Garota malandra que parece boneca
sua pele é macia e quase me cega
floresce menina meu dia nublado
Morena pompoza com dedos molhados
navega nas ruas sem nenhuma água
requebra e bate palma por nada e por mim
não chora desse jeito que eu choro também.
Dirigi cantando bossa nova como ninguém
pra quem gosta de dormir em qualquer canto escuro, fuma um cigarro que cheira costume
e vira uma deusa quando toca tamborim.
Sorriso de moça que vem lá de fora
faz poesia e é engraçado, pois todo mundo chora.
Meu coração é de pedra mais desmancha facinho,
garota da blusa lilás com capa graciosa, não olhe pra trás, pois te ganho com os olhos e depois não sei mais...
Garota saudável que me dá luz
não fujas assim sem me falar seu nome
me indica o endereço e sua flor codinome.
Porque seu rebolado naquela avenida
merece muito mais que um simples jardim.


C.

quarta-feira, 30 de maio de 2007

contrapé modelo bem forte

converso comigo antes que me esqueça. acordo de manhã e fico passando cremes e cremes e loções e loções e pastas e pastas. olho isso aqui, olho aquilo acolá. me reconheco no espelho que me faz gêmea. olho meu seio e levanto-os com as mãos sonhando uma plástica. olho de costas e quem sabe uma lipo. aqui dentro sei que não vou fazer, não vou fazer. quero acreditar que cada idade tem sua beleza e que eu posso doar tal dinheiro para um elefante orfão em Bombaim e isso sim é coisa bacana. e, poxa vida, envelhecer não pode ser tão ruim assim. o joelho continua sendo seu, o seio continua sendo seu e as rugas passam a ser suas. o joelho continua sendo eu, o seio continua sendo eu e as rugas passam a ser eu. o corpo não é meu, é eu, sou eu. se você tem um pai ou mãe médico é só ir até a estante e procurar um livro de anatomia. agora me diz, me diz, me diz que quero saber: onde está a mente? você pode me dizer com exata precisão onde está o encéfalo, a caixa encefálica, o crânio, o cerebelo, mas não pode me dizer não onde diabos a mente se esconde. e os sentimentos o que são? são meus, são eu, sou eu. e como ir ao hospital e fazer o eu seio comer silicone até quase vomitar? como ir na clínica e deixar que tirem um pedaço de você, do seu eu nádegas? o engraçado é saber que vou te encontrar daqui 50 anos e ainda vou saber que é você, que é você. que o olho é você, que sua mente é você, que seu sentimento é você. talvez não lembre seu nome, mas nunca esquecerei um traço. uma pessoa com rosto e sem nome.

-pois é, é assim que é...

estávamos discutindo no clube da esquina. algo sobre a existência e algum sentido, algo sobre o caminho e algumas flechas, algo sobre como me sinto amputada de alguma percepção. algo que me falta e que me toca lá dentro, lá dentro. você pode dar 6 palitos para alguém e pedir que com eles construa 4 triângulos equiláteros. a solução consta em algo 3D. mas não, estamos presos só no aqui, no agora. e se você não existe aqui e agora, talvez você não exista além da minha mente. você não está aqui e nem agora. o que existe é só o aqui e agora, não? e quem pode dizer que sonhos não são aqui e agora? ou talvez lá e ontem? que quando eu sonho, talvez você também sonhe. e sou sonho, você é sonho e quem sabe nos encontramos e jogamos aquela sinuca com a alma ou seja lá como for. né? talvez queira me apegar nisso porque você ai, tãããão longe... quero acreditar que esses malditos filmes fantasmas que não me descansam têm a ver com algo real. afinal, se saiu de mim, é eu. meu sonho sou eu. quero muito tanto um bocado saber se sonhou, se ainda sonha. saber se também esteve lá naquela rua, olhando a sombra dos galhos no asfalto, aquela que certa vez comentamos gemeamente. saber se se estivesse aqui na região, iria gostar da conversa de ontem como gostei, se iria pegar mototáxi quantas vezes fosse necessário e se iria ajeitar minhas mantas na mochila enquanto eu chorava bobeiras. se ia olhar nos meus olhos e ver poesia, como sempre grito e você não escuta. saber se daqui 50 ou 5 anos, quando tudo reacontecer, se você vai me dizer seu nome e se vai perguntar o meu.

e você nem imagina, mas me inscrevo em todas promoções possíveis para ganhar uma viagem para ver algum pop show pela américa. e juro que toda noite torco para ter sorte suficiente.

F.

terça-feira, 29 de maio de 2007

Nuvens de algodão

Gritei com minh'alma que não parava de suspirar enquanto você cantava com aqueles olhinhos apertados e tão brilhantes no meio daquele nada, um nada só nosso, todo nosso. Tão azul que anestesiava o silêncio do frio, no encontro de nossas mãos congeladas e quentes ao mesmo tempo, uma com a outra uma noutra.

Apenas mais uma de amor - repetia em pensamento ouvindo você cantar todas as músicas que eu mais gosto de ouvir você cantar. De um jeito todo doce que me encanta até nas reclamações de frio, de dor, de saudade.

Fechei os olhos devagar mais de uma vez, e te ouvir falando deles é como um tobogã que sai lá do alto perto das nuvens e vai até lá embaixo encostando na areia, acelerando tudo nas curvas que me davam mais que frio, mais que borboletas, mais que mudanças de estados dentro da minha barriga vazia.

Depois que te dei aquele céu bordado de hoje sem você nem perceber, senti seu gosto de algodão num beijo de saudade.


C.

Piscar de olhar

Meu tempo de um piscar de olhos está preso no conta-gotas para poder te acompanhar.
Meu trem vai parar na tua estação e pretendo demorar. Trago na bagagem os mais exóticos temperos, os perfumes mais instigantes, os fios mais insinuantes e as flores mais delicadas que encontrei no caminho. Além dos agrados e lembranças, tenho no bolso direito do meu casaco vermelho uma pequena dose da certeza de que não irá se arrepender por me esperar, no meu tempo, na tua estação.

Vou logo avisando que não me acostumo fácil com às mudanças de fuso horário, mas espero que a adaptação seja acompanhada de pequenos prazeres, para quando chegar a hora de partir outra vez, possa levar, não apenas a memória, mas os reflexos dos seus traços fortes nos meus olhos da forma mais íntima e intensa que conhecer com você.


R.

Ich liebe den Moment, in dem man fällt.

Amo aqueles momentos inalienáveis, aquela estranha familiaridade e todas aquelas coisas intransferíveis.
Amo cada fragmento de segundo em que eu me perco, me acho, me jogo e caio.
Amo aquela parte em que nem o passado nem o futuro interferem, aquele pedaço de insensatez que sempre me rouba 15 minutos.
Amo a minha falta de tempo, mas gosto mais ainda do tempo que eu acho pra compartilhar a minha irracionalidade com ou sem rodeios, embebidos de vinho e perfume francês.

Talvez eu tenha me acomodado na clandestinidade dos meus atos cometendo meus crimes aqui e ali, crimes que não são só meus.
Por isso amo essa verdade irremediável, esse escândalo de sentidos e esse afloramento inescrupuloso.
Sinto-me como uma verdadeira irresponsávelcúmpliceculpadadesajuizada.
Tudo em função daquelas coisas que já não consigo e nem quero olvidar.

S.

segunda-feira, 28 de maio de 2007

Morrer não dói

Eu abaixei a cabeça para que ninguém me visse chorar. O ar de desespero era tão grande, tão negro que eu tive que fingir força, só para a luz clara e perdida que mantia o silêncio de morte não refletir em mim.
Minha mãe perdeu o olhar, e eu parada ali, olhando o dela, perdi também. Enquanto eu tentava abraçá-la acabávamos tremendo, tremendo e tremendo tanto, que escutei um trem vibrar no lugar do coração dela, pensei que ela fosse o trilho, mas ontem soube que o trilho sempre fui eu. Um trilho que não pode mudar nadinha, para que o caminho faça sentido e não termine em qualquer abismo.
Tomei quatro cafés quentes vendo ela fumar um maço inteiro de cigarros. Eu continuava abaixando a cabeça enquanto ela corria feito criança rodeando aquele caixão escuro, cheio de detalhes em dourado. Corria, olhava, falava, chorava feito criança - parecia minha filha - enquanto eu olhava a vela queimar ardendo os olhos, e ela se movimentava para frente e para trás, envolvida em algum balanço tranqüilo repetindo pequenas frases de alguma canção.
De repente como um aberto, ela me abraçou e disse bem baixinho na ponta do meu ouvido "Parece uma anestesia que não me deixa entender nada", e eu, me sentindo completamente fria, lembrei das borboletas do cazuza e sussurrei como se fosse vento na orelha dela "Morrer não dói, Mãe.". Vi aqueles olhos deslizarem devagar acompanhando a mão que apertava aquela outra mão roxa, gelada e morta da Dona Rosa.
Olhei-a dos pés a cabeça, toda encaixotada, brilhante de flores novas. Flores nuas de temor. Fui ao banheiro e quis fumar do mesmo cigarro que minha mãe - já que é pra morrer - pensei sozinha. Sentei na privada fechada e jurei querer ouvir aquela voz, aquela respiração e aquele arrastar de pés de novo, mas não pude querer muito, minha mãe continuava lá, na beira do caixão, só os olhos que se mexiam.
Dentro de seis horas que fiquei ali achei que ia enlouquecer junto das centenas de vezes que fui apertada em forma de abraço, ouvindo palavras tortas, perguntas mortas e medos novos. Os treze graus que faziam na madrugada, passavam retos como se eu nunca tivesse sentido nada. Tive ânsia várias vezes, e meus olhos pregavam com tanta força que lembrei de Jesus na cruz.

O maço dela acabou de novo, abaixei minha cabeça e não quis nunca mais chorar, pensei que a morte podia ser confortável e duvidei dela mesma até amanhecer, vendo aquelas velas queimarem, as pessoas sumirem, menos ela, minha mãe, que continuava paralisada, olhando para a vida, pensando na morte.
Fechei os olhos e senti uma cabeça se ajeitado no meu ombro esquerdo, meu nariz trancou na hora, meus dentes rangeram e meus ouvidos doeram com aquela voz lenta e doce me perguntando "E se eu morrer?" e entre um choro amargo, meio engasgado com o nó que crescia feito bexiga na minha garganta, respondi mais de sete vezes morrendo de medo - "Não sei.. Não sei.. Não sei.. Não sei.. Não sei.. Não sei.. Não sei..." até que minha cabeça encaixou em algum lugar da cabeça dela.


"O pó volta a terra como o era, o espírito volta a Deus que o deu." Eclesiastes 12;7


C.

E o que diriam as moças do bordel? O senhor das senhorias encontrou sua prisão. Pecou nos braços limpos, se limpou.
Como adivinharia que aquela dos cachos definidos e olhar submisso era sua sentença? Nunca entenderia que viveu todo aquele horror só para esse pecado consumido. A vida torna-se aguda quando afunilada. Os sentidos exageram e a sensação desespera. Já fora apaixonado sim, tinha certeza. O que não lhe contaram é que nada daquilo era amor e ódio. Nunca se odeia quando apaixonado. Ódio está de mãos dadas sempre ao amor.
Que letra mais batida. E grite asneiras aquele que nunca largou a vida para visitar um coração.
E grite poesias que eu te amarei. Não com todos os tons. E nem melodia. Só sem matéria.
Se somos um emaranhado de partículas concentradas num lugar, então é esse também o amor.
Concentração.

N.

domingo, 27 de maio de 2007

saúde

C sinto que estou de pé num deserto com as G mãos estendidas, e C você chove G torrencialmente sobre mim. F minha alma tem as curvas e a forma da Am dor, F e eu quase não me sei ser sem Am ela (G) C vive cá dentro como se fosse G moradia própria, C vai até um limite e depois G constrói um muro de Berlim. não sei, mas não paro de ver as listrinhas Am do seu shorts na minha F alma quando olho para a sua Am janela. (G) C almas, quero um gole da tua G alma C e um outro do seu G sorriso. (A G INTENSIDADE) F alcoólicas de Hilda Am Hilst, F árias pequenas para Am bandolim. G e por que não dizer que o mundo C respirava mais G se ela apertava assim Am seu colo? F antes que o mundo acabe, você, deita-te Am e prova o F milagre do gosto que se fez na Am minha boca G enquanto o mundo grita C belicoso. e ao meu G lado te fazes C árabe, me G faço israelita e nos cobrimos de beijos e de C flores. F antes que o mundo acabe, antes que acabe em Am nós o desejo... F aflição de ser eu e não ser Am outra. F aflição de não ser, amor, Am aquela. e por um G triz não te sou C também. vou G ficar com você na cabeça a noite C toda. coma G frutas e legumes, por C favor. se não te G cuido eu me C morro.coma G frutas e legumes, frutas e legumes C por favor.

sábado, 26 de maio de 2007

Sob consentimento meu.

Saí de casa confiante de que hoje seria diferente e foi, minha indiferença não ficou tão evidente mas a minha superioridade cínica voltou como se nunca tivesse ido embora.

Naquele momento eu apenas olhei, e com frieza diagnostiquei o que já estava claro há muito tempo. Deixei que falassem no meu lugar, também não me importei com as longas pausas e nem com aquele silêncio que antes era incômodo.

O silêncio foi música, e eu pude ter o prazer de me calar e ouvir com paixão, por que era isso que eu queria, queria que meu silêncio fosse sinfonia, que invadisse cada canto seu e te atormentasse como a sua inquietude me atormenta, que fosse agudo e grave, que quebrasse copos e que incomodasse vizinhos, que acordasse o mundo para eu então apenas olhar e simplesmente deixar passar, deixar passar aquele momento de dizer as coisas certas. Eu não teria coisas belas nem certas a te dizer, eu não esperaria pelo momento por que sei que ele nunca vai existir, mas caso existisse e entrasse pela janela eu abriria a porta, me esconderia debaixo da cama ou o expulsaria com fervor.

De verdade verdadeira eu me importei com pouca coisa, só pensava em tudo aquilo que você queria saber e em tudo aquilo que eu nunca ia falar.

Não doeu, não machucou nem arrancou pedaço, só peguei a gripe da apatia.

E é só por isso que eu não canto, por que quando estou com você, a única coisa que gosto de ouvir é o meu próprio silêncio, mas para ouvir o meu silêncio eu não preciso de companhia.

S.

Fui flor em outra vida

O que você foi em outra vida? Essa questão sempre vem à tona em algum momento. Vai me dizer que você nunca pensou nisso? Claro que pensou. Todo mundo pensa. Eu já cheguei a achar que essa é a minha primeira vida, porque é torta demais pra já ter experiência. Mas mudei esse conceito quando meu médico homeopata, que digamos é um pouco mais espiritual que os outros me disse em uma das consultas em que eu estava ansiosamente aflita, mexendo o pé pra lá e pra cá, querendo contar milhares de coisas em duas frases pra que coubessem no tempo curto: – o lóbulo da sua orelha tem um formato peculiar. Você foi feliz em outra vida.
Quer dizer então que além de eu ter tido outra vida, eu fui feliz nela. Coisa que me parece meio complicado de entender tendo em vista essa fase sem-sal sem-açucar em que me encontro no momento. E que coisa é essa de felicidade, ser feliz e etc? Ninguém é totalmente. Ninguém. E quem disser que é está mentindo. E pra piorar meu lóbulo tem um formato peculiar(?). E que tipo de coisa é essa de ver vidas por lóbulo de orelha? Vai entender. Mas eu tive outra. Ele disse e eu acreditei.
Fiquei horas pensando nisso hoje à tarde. Eu não acredito muito nessas coisas de outra vida, cosmos, energias misteriosas, ou outra parafernalha-qualquer que não faz a mínima diferença pra ninguém. Pra falar verdade em energia em até que acredito. O bastante para eu querer entrar urgentemente na yoga para equilibrar as energias internas. Mas isso passa, juro que passa. É só reflexo da minha fase atual de tpm sem estar na tpm. Vai passar.
Passei o dia todo pensando nisso. Que diabos eu fui nas outras vidas? Um gato talvez. Eu ia gostar de ter sido gato. Mas acho que vou deixar isso pra minha próxima. Cachorro não, eu gosto mas não pra me ser. Passarinho então, de jeito nenhum. Mania chata essa de voar nas pessoas. Insetos e o filo artrópoda de modo geral nem pensar. Tenho asco de tudo o que voa e faz aquele barulhinho inusitado quando é pisado – crac – Esse mesmo. Não é a toa que eu tive arrepios da cabeça aos pés lendo paixão segundo G.H. Clarice que me desculpe, mas esse não me deu. Morria a cada linha. Realidade é amarga demais sabes?! Sei que sim.
Voltando ao ponto inicial, passei o dia todo pensando o que fui eu em vida passada. Número um: Tinha que ser feliz. Isso é difícil. Ainda mais pra mim. Dorzinha, dorzinha... Se eu não gostasse tão sufocadamente, acho que ia começar a fingir de tão colorida-dolorida que ela me parece. Acho que só o número um me basta. Na verdade me basta porque não me veio nada além dele em mente. Mas pensando bem, quer coisa mais complicada nessa vida do que isso? O poetinha vagabundo já dizia “É melhor viver do que ser feliz”. E se ele já não tivesse dito, um dia com certeza eu ia dizer. Se eu tive vida passada, logo eu vivi duas vezes. A passada e essa. E fui feliz em uma só, na primeira suponho. Nada mais justo. Não é a toa que o peso do sobrenome ficou pra essa. E que peso.
A questão é que eu tive um insight. A questão não, a resposta da questão. Flor. Claro! Não querendo contar vantagem ou algo assim, e quem entende de flor vai me entender também, mas eu fui flor. Não tenho a mínima dúvida disso. Flor. Não me pergunte que flor, porque aí você já está querendo demais. Isso até passou pela minha cabeça. Sobre o tipo de flor eu digo. Margarida talvez. Lírio de jeito nenhum. Lírio é a minha flor preferida, mas eu não vou me enganar achando que fui lírio. Não fui e pronto. Rosa talvez. Daquelas bem altas. R0sa-cor-de-rosa. Não. Muito rosa pra mim. Acho as vezes que eu tenha sido uma flor de erva-daninha, daquelas que se agarram à beleza de todas as outras coisas para se sentir grande, graaande, graaaaaaaaaaaaaaaaande, e quando você menos espera tomou conta do jardim todo. Estava quase certa de que eu era essa. Mas não, felicidade não é isso. Não só isso.
O nome da flor talvez seja o que menos importa. As flores são pessoinhas maravilhosas e de uma pureza inigualável. Elas sentem dor como nós sabiam? Sentem sim. Sentem dor por elas, pelo jardim e pelo mundo todo. Se doem inteirinhas. É por isso que às vezes elas murcham e às vezes se enchem de vida. Não se engane achando que é no murchar que mora a dor. Muitas vezes é no se encher de vida. Isso dói. Dói, dói.

Fico feliz de ter sido flor-sem-nome em outra vida ou qualquer que seja o nome disso. Mas uma coisa ficou errada na história. As flores são felizes e infelizes ao mesmo tempo. Porque são solitárias. E as pessoas solitárias são assim. De qualquer forma, fui flor. Não inteiramente feliz, mas fui. Quer coisa mais bonita nessa vida (ou em outras) do que ser flor? Qualquer que seja. Fui. Tenho certeza. Não achem que eu estou louca, por favor. E nem duvidem da minha essência já vivida. Fui flor e ninguém tira isso de mim. Nem você, nem você e nem você. Pensando bem, talvez eu seja flor nessa vida também. Vai saber.
Só sei que hoje o dia está em um cinza terrivelmente ardido, quase insuportável, e não poderia existir dia melhor para isso. Para viver isso.
Com todo esse papo de flor, não sei se o cheiro que sinto agora é das margaridas brancas que estão em cima da mesa ou de mim. É que o jardim cresceu em mim de um jeito tão imensurável que eu deixei de observar o jardim e passei a ser o jardim. Ser já, jardim. Cheinha daquele colorido-dolorido que eu adoro. Flor na outra vida, jardim nessa. É isso.

Só me resta dizer agora, que te vejo em outra vida. Quando formos gatos.





L.

sexta-feira, 25 de maio de 2007

...

quando não planejo acontece
quando me arrumo não saio
e quando saio não acho
e se não acho já não procuro
mas quando não procuro me encontras
e quando me encontras é que eu me perco
e se só me perco quando me encontras, já não me entendes.
daí é quando me explico,
te explico...
até cansar de ter hora pra tudo
de ter medo de ofender
de tentar te esquecer
de procurar não te querer
e de ter sempre o que dizer.

S.

terça-feira, 22 de maio de 2007

.

Aquelas luzes comuns em prostíbulos, reluziam as orgias da festa que fui te buscar, seu cabelo todo molhado e bagunçado, seu corpo cheirando a sexo e seu nariz escorrendo de tanta coisa que deve ter entrado por lá. Mesmo assim, mesmo não (te) querendo, enxerguei todas as imperfeições perfeitas de quem é digna de acordar na minha cama. Mesmo nesse seu estado assustador e tão comum, meu corpo cheirando a perfume francês desejava o seu exalando traição. Te coloquei no carro enquanto aqueles que tinham te comido a noite inteira riam da minha cara, liguei o rádio e estava bem naquela estação universitária que tocava os melhores jazz de todos os tempos, sabia que você iria gostar. Sua cabeça continuava batendo no vidro do carro a cada curva e seus berros acordavam o bairro inteiro. Cheguei em casa, acendi as luzes, abri a porta do banheiro, deixei você encostada ali naquela parede decorada, toda colorida, que a cada banho um novo desenho alguém descobria. Liguei o chuveiro e fui tirando sua roupa, em um misto de mãe e mulher. Curti cada pedaço do seu corpo e te usei, como uma peça barata que você costumava se apresentar. Subi as escadas, peguei os lençóis mais brancos e toalhas novas. Enxuguei seu cabelo, escovei seus dentes com aquela esova com motorzinho, a pasta doce que cheira a remédio e deixei a luz do espelho ligada. Você hesitava cada toque, tive que ir escorando na parede do corredor até chegar no quarto. Te vesti uma camisa que meu pai tinha esquecido em casa (ele sempre se suja comendo!), e admirei cada milímetro dessa mulher desprezível que você insiste ser.
A hora que você acordou daquele "sonho" que com certeza não irá lembrar, ali em cima daquele criado que se não fosse mudo seria meu inimigo, estavam as panquecas americanas, o café que tinha acabado de passar, o morango com mel, o chocolate suíço e as amêndoas que você tanto adora. A hora que aparecei na porta ouvi milhares de desculpas e com um leve beijo esclareci o bom-dia que ali começava. Fizemos sexo com gosto de café misturado com ressaca e manhã.
Tive que faltar ao almoço de domingo na casa dos meus pais, porque até minha avó sentada na ponta da mesa perceberia os olhares transbordando desejo. Atrás da porta do banheiro do restaurante ninguém imaginária que aquela menina de saia rodada e sapatinho de boneca estava com as pernas abertas em cima daquela mulher de vestido e franjinha angelical. Uma só menina-mulher.


A.

domingo, 20 de maio de 2007

A morte;

... nunca esteve tanto na minha cabeça como nos dias frios e chuvosos que eu enfrento aqui. Nunca pensei tanto em fazer surpresas boas para os meus amigos, como nos dias, por agora. Nunca desviei um olhar seu, sempre te encarei, olho-no-olho, como fiz hoje. Nunca neguei um "vamos sair" como o de há dez minutos atrás.
Agora vejo a falta que as gotas secas fizeram quando resolveram não me molhar. Fugi.
Eu sinto aqui, saudade das suas tentativas de me fazer feliz por apenas duas, ou até mesmo três horas.
Tenho medo e anseio. Palavras que nunca foram adjetivos da minha vida.
Começo aqui e logo termino ali...

... outra vez eu pude sentir meus lábios secos e frios, salivando de angústia.



D.

sábado, 19 de maio de 2007

Me dá os seus olhos e entra dentro de mim.
Mas só com o corpo, para não doer demais.
Você não suportaria a dor de mim.
Me dá o seu coração, mas não exija o meu.
É espada só para Rei Arthur.
E esses tempos já foram há muito.
Me deixa ser Don Juan Demarco.
Que eu só marco, mas não demarco.
Sou só o limite.
Fora, é livre. Voe.
Voe porque a arte te(me) permite.
Venha me ser arte e só não esqueça
que o preto esconde o branco,
mas não vice-versa.

N.

Amargo-doce

E até seu suor parecia doce na noite em que nossos olhares se encararam pela primeira vez;

L.

quinta-feira, 17 de maio de 2007

would if i could

esse samba não é seu e é por isso que eu não vou cantar, e se não canto é justamente pra ninguém ouvir. além do mais eu não canto e não danço, não ligo no dia seguinte nem espero resposta, não alimento falsas esperanças e não peço mais desculpa. além é claro de sempre querer nada com nada.

isso lá são horas de me ligar? sim, isso tem importância. meu cigarro tá aceso e eu sei que você não fuma, meu vinho tá derramado por toda parte e eu sei que isso é o que você condena, tem gente na sala mas os que me visitam não te fazem rir e olha que não vou nem entrar em detalhes e falar sobre os meus porquês, só para você não se enfurecer de novo com a minha postura mundana.

então por que veio? então por que você aparece assim se não fuma o meu cigarro nem bebe do meu copo? por que veio se nem faz questão de rir com quem chegou aqui bem antes e se você já não se interessa pelo meu desassossego? por que? pode me dizer?

nunca pedi pra que comprasse as minhas brigas ou pra que pulasse no meu lugar. o problema não era o vento, muito menos meu olhar sondador. se quer saber, já não venta tanto assim e nem gana de ficar olhando eu tenho. o problema é que não era assim desse seu jeito que as coisas aconteciam, e não era assim que eu disse que poderia ser.

então foi tudo engano? caso do acaso, vaso raso? então tá bem, ou melhor, ainda bem.
já estava mesmo na hora, eu só estava esperando você terminar de me condenar para eu poder dormir em paz.

ah e falando em hora acho que deu a sua, sinto que é tarde, já é bem tarde pra mim.
mais tarde ainda pra você.

S.

soneto sobre cheio de grama

hoje as coisas aqui estão bem tensas. talvez você nem saiba onde diabos seja "aqui". e é assim, tão assim, que as coisas acontecem entre dois. é tão assim que sinto. e sinto muito. distante como se fizesse tão e não parte, como se de dois só pudesse esperar nada. ou como um abraço gêmeo que voa longe como pipa em campo. que voa longe com o vento. e vai fugindo, voando, tão leve, tão pássaro. continua fugindo, rodopia e rodopia. e frouxa de rir, sem saber até que ponto vou aguentar, sem saber quando vai chegar a hora de cair na grama macia, cheira de ternura e rir e rir e rir e rir e rir, vou correndo. e depois de tanto, noto a pipa caindo, mansinha como o vento, silenciosa e branda como bruma, beirar a rodovia. olho para os lados e vejo que estou sozinha e de repente, como quem acaba de perceber uma formiga no meio do calçadão, percebo o meu riso fazer-se pranto. abraço o chão, a terra e qualquer coisa que possa relar, pegar, qualquer coisa sólida que me faça acreditar viva. qualquer coisa que sinta tocar minha pele e que me faça saber que ainda tenho sistema nervoso e tato. noto a nostalgia da grama verde, tão verde que reflete o sol, que quase reflete a lua. tão, mas tão verde que chega a ser densa, tensa, suspensa. quase preto-e-branco, tons de cinza. e da calma fez-se o vento e da urgência um furacão. me dá sua mão, meu amor. não tenha medo não –eu disse fingindo que não tenho- vem olhar o mundo aqui fora, olha como a grama é verde, tão verdinha, tão sua. joga seu corpo no mundo, vai sendo como pode, te amo em cada canto seu, me da sua mão, pô! e assim, sem saber quem deu a mão pra quem, a gente foi andando, tocados lá dentro pela vida preto-e-branco que vira cor passo a passo –como filme bobo numa tarde com pipoca.

eu velhinha vestida com rugas. um amor de bengala que insiste. netinhos correndo pela casa –um retrato que não existe. então se não existe, invento. sento no banquinho alto com dificuldade para equilibrar por causa da artrite, posiciono o cavalete e pinto. vou pintando, cantando e pintando e cantando. como fotografias instantâneas da felicidade, lembro de como era, sem talvez nem ter sido. e mesmo que tenha soltado a minha mão eu ainda seguro a sua. mexo nos seus dedos como sei que bem gosta, me apegando a cada picuinha, decorando cada detalhezinho. aprendendo de cor, com o coração. decoro os dedos com coisinhas artesanais, com anéis de mentirinha e continuo correndo atrás da pipa, correndo, correndo. vou perdendo partes de mim, sem saber se vale, sem saber se devo, sem saber. vou correndo e me jogando na vida, enquanto perco partes de mim, enquanto já me perdi inteira. e continuo correndo sem saber porque corro. e a vida, e a pipa, sem saber porque fogem. e de repente de um quadro, de um retrato, de um momento imóvel fez-se o drama. e das mãos empalmadas fez-se o espanto –como o susto de línguas que se encontram pela primeira vez. e que se encontraram pela última. e de repente, não mais que de repente das bocas unidas fez-se a espuma e quase o vômito.

F.

Quase me perdi por um minuto

Olha eu brincando de suicida outra vez, subindo até o ultimo andar só pra olhar a paisagem que me dá náuseas mas que ao mesmo tempo me causa um fascínio inexplicável.

Olha eu gozando dos loucos e entrando pela porta da frente do pior dos manicômios.

Olha eu, brincando com fogo sem querer me queimar e tendo aquelas vontades estranhas de dias muito normais.

Será que as crises são só minhas? As indagações e os anseios só meus?
A frase não dita, o cigarro pela metade e todas aquelas coisas que hesitam entre um olhar e outro são frutos das minha imaginação transgredida? Ou não?

Já me entreguei a meditação melancólica das minhas faltas e exageros, não entendo esse meu fascínio pela confusão, muito menos minha atração pelas coisas que eu viavelmente não posso ter.

Logo eu que sempre fui dois pra frente, um pra trás e meio pro lado estou dando voltas e mais voltas nesse círculo vicioso que eu me nego a sair.

S.

quarta-feira, 16 de maio de 2007

Não sei

se eu pergunto como você está, se o colégio ainda te enxe o saco, se seu pai anda daquele jeito, se parou de roer a unha, se a giovana ainda tem que fazer teatro, se o viva-voz parou de ser usado, como está a peça de teatro, qual filme viu essa semana, se tem usado muito roxo, se continua olhando a lua, se realmente parou de fumar, se seu olho voltou a coçar, se tem ouvido o sino da igreja, se limpou a baba do canto da boca, se o orkut te estressou, se o msn saiu de linha ou se seu nick que mudouu, se as ruas tem passado rápidas demais, se esqueceu de me telefonar ou se o telefone perdeu a linha, se o bosque foi desviado do nosso caminho ou se ainda têm passado por lá, se as notas continuam as mesmas, se o arco-irís ainda é maior que o mar, se ainda tem visto borboletas, se tem estudado filosofia, se o batuque parou de tocar, se sua bolsa já perdeu a fivela, se o relógio continua à girar, se o nosso mundo parece triste ou se sou eu que não sabe voar, se a grama continua molhada, se às gotas de àlcool tem buscado se afastar, se o sorvete ainda continua uva, se o dedé continua valente, se meus olhos continuam crêntes, se você ainda tem um bom paladar, se os calos ainda estão nos dedos ou se você já mudou de lugar, se as luzes continuam as mesmas, se ainda é ímpar, se voltou a flertar, se está enlouquecido com o blog ou se é a erva que te fez rodar, se ainda vive no mundo dos sonhos, se tem acendido velas nos cantos, se tem visto nosso cacto secreto ou tem tomado o mesmo café tradicional, se tem plantado muita semente, se o gosto de sangue já saiu da gente, se algum dente anda doendo, se o intervalo demora a passar, se as músicas tem feito você pensar, se foi meu jeito que mudou a gente, se a perna de pau tá demorando pra quebrar, se teu olhar continua dormente junto com teu piscar-sonhar, se o nariz tem soado bastante, se parou com aquela cara de malandro, se tem trabalhado com fome, se fica chateado com o ônibus, se seu apelido mudou, se o disco riscou, se o esmalte acabou, se o sonho parou de escorrer, se a barriga tem roncado até doer, se ainda acorda assustado, se o dia ontem foi todinho nublado, se os pássaros tem te cagado, se seu ouvido tá todo estourado, se seu verde continua froxo, se o vento continua gelado, se o acento mudou de lugar, se já aprendeu a arrotar, se cortou o cabelo por tédio, se tem tomado muito remédio, se tem se apaixonado muito ou se o inverno te fez esfriar, se a saudade anda apertando, se você tem que custar pra lembrar, se o ritmo continua lento, se tem se jogado pra qualquer lado, se o alecrin ainda brota no peito, se o amor ainda tem jeito, se a viagem mudou de andar, se a escada continua difícil, se aquele bandido mudou de edíficil, se a tímidez já voltou a falar, se o dedo continua estalando, estralando ou cutucando, se você continua me amando e se tem pensado no fim...

Eu quero, mas não sei como.


C.

segunda-feira, 14 de maio de 2007

Era

uma vez o sorriso que trocávamos, e a aura amiga que nos cuidava.
Me lavava EM ti, no teu rio.
Nele respirava e nadava, dele bebia e nele mergulhei.

Nele me afogaste,

e tudo que era pra ter existido em perfumes e cores, agora existe em pó, pra coçar meu nariz.
Os elos já se foram, mesmo sem nunca haverem sido.


Agora, me lavo DE ti.


Ouça isso, pois, se te toco, é a ultima vez que o faço.




G.

domingo, 13 de maio de 2007

Perfume.

Eu sempre tento, mas nunca consigo.
Estou vazio e farto de vontade para ir além, de mim e de tudo.
Mas não dá, eu sempre travo, eu sempre fico sem palavras.
Eu não entendo às vezes, me esforço e logo vejo que é muito grande, é muita vida.
Queria entender e não ligar, mas é impossível deixar isso passar assim, sem nunca conseguir escrever, sem nunca tentar transpor o que se passa aqui dentro.
Dentro de um peito fraco, podre, completamente branco. Puro e leve.
Eu não tenho mais força, nem esperança, e isso tudo aqui, me ergue, me deixa do tamanho do infinito. Não o meu infinito particular, aquele mesmo infinito que nós sonhamos, é, esse mesmo infinito que nos esconde.
Que não nos deixa só. Que sempre nos deixa com a boca seca, com as pernas bamba e com um sorriso estampado-na-cara.
É alívio, é nosso.
Pequeno.
Grande.
Dispara o coração e nos segura contra o vento. Que sopra forte, sem direção. Que bate em nossos rostos e nos deixa com cara de vida.


Essa nossa vida, amiga da arte, parte que o sol nos ensinou.



D.

sexta-feira, 11 de maio de 2007

Vinho - inho - inho.

Então eu fui na adega comprar vinho, cheguei lá e pedi um daqueles grandes de cinco litros, mãno, eu não tinha dinheiro, faltaram três reais, daí peguei o de 4 pila mesmo.

Um maluco pediu 1 reals pra mim, não tinha, dei 50 centavos e ele disse que eu poderia pegar limão a vontade mas não tudo porque eu não dei 1 reals. Limão bom sabe, limão rosa, daqueles de fazer limonada, daqueles de temperar a salada, daqueles bem feios de olhar e dar dó.

Eu peguei, nunca faço isso mas hoje eu fiz, sempre tenho vontade mas nunca faço. Bah, foda-se, eu comprei limão de um desconhecido e daí?
Depois disso eu agradeci, me despedi do dono do estabelecimento e do tio que me vendeu limão, peguei minha sacola com doce e azedo e já fui saindo como quem sai de um wc depois de um longo xixi desesperado. Me senti meio estranha por estar tão longe de casa comprando vinho ao meio dia. Mas parei, pensei, observei minhas aquisições e então tudo fez sentido.

Eu já não era mais uma garotinha mimada atrás de um hábito que a gente apelida de vício, eu era aquela que comprou limão as doze horas do dia 11, aquela que pediu desconto e que viu a confusão nos olhos de um estranho que não estava em casa para beber no bar e que ao se deparar com a minha figura escolhendo os "limão" não entendeu mais nada. Ou não. Ou eu entendi tudo errado e não foi nada disso, e eu simplesmente fiz o que tinha que fazer e nada disso foi sublime suficiente a ponto de ser digno de ser relatado.


Mas se você acha que poesia é métrica, então entra na fila e aproveita pra comprar coquinho, e se não tiver pode comprar algum limão que eu garanto que é do bão.

S.

quarta-feira, 9 de maio de 2007

Carta secreta para uma mulher ausente

Vai, entrega pra ela esse sorriso meu. Não esquece de dizer que sinto saudades, e que demoro pra deixar de pensar em tudo o que foi. Mas explique que talvez o melhor que acontece é o não acontecer das coisas. Diz pra ela que o que não acontece é lindo!
Diz tambem que se não quer lembrar-se de mim, é melhor que fique longe das paredes, porque estou em todas elas, escorrido, atento, gritando meus segredos mais bonitos, e que meu segredo ainda é aquele que não existe.
Não esqueça de dizer que sinto muitas saudades, e que tenho medo de minhas gavetas. De encontrar nelas o motivo para o suicído, para a venda barata da minha alma para o capeta, para mais um amor, para mais uma saudade sem fim. Diga à ela que ainda acho lindos os fins, e que acho bonito matar o que já não é vida, só que ainda acho belo saber andar nos meios-termos. Mas que estou com tanta saudade que nem sei o que ando dizendo. Diz pra ela que ainda tenho uma cachoeira de histórias para os ouvidos dela, e que ainda sei de seus amores.
Mas diga que estou com saudades, principalmente dos beijos mais puros, e da sinceridade mais subentendida. Diz tambem que sinto falta daquela nossa rebeldia de butequim, daquela revolução secreta, do nosso humor misterioso de Monalisa. Diz que já me lembro o que é loucura, e que peço desculpas com frequencia ainda. Peça desculpas por isso, mas diga que o peso das coisas é bom, massageia com dor. E diz que tenho saudade do sabor daquela dor, insuportavelmente bela. E que não aguento mais as homenagens secretas que ficam sem seu ar.
Peça pra que ela venha me curar dessa epidemia que começa a se espalhar por tudo: sua ausência.


G.

Seu nome é Volúvel Leviano.

Tem dias que eu acordo e sei de tudo, outros já não sei de mais nada.
Minhas certezas desmoronam a todo instante, se desmancham cada vez que o vento sopra, muda de direção e leva meus pensamentos, minhas angústias e minhas alegrias.

Venta e bagunça o que demorei pra arrumar, venta e arruma o que demorei pra bagunçar, venta e eu fico parada vendo pra onde a fumaça vai ir, venta e eu já sei que alguma coisa vai sair do lugar, e já não sei se fecho a porta ou abro pra ventilar.

Quem anda na rua tropeça com meus restos perdidos por aí. Quem anda na rua em um dia
ensolarado de outono, quem acha lindo todo contraste e toda menina com cabelos desgrenhados mal sabe que o vento é maldito, mal sabe que ele veio pra já ir embora. E é por isso que nossa relação sempre foi de amor e ódio, nos dias que eu o amo eu não poderia ser mais feliz, mas nos dias que ele resolve brincar eu não entendo porque sou assim.

Sempre quis ter os pés no chão pra deixar a cabeça e o coração irem aonde quisessem ir.
Pois é, eles foram e até agora não voltaram... E eu espero com aquele falso moralismo de uma noiva aflita que tem medo olhar pro lado e mudar de rumo. Espero a boa vontade de quem pode trazer de volta o que um dia com um vendaval me tiraram.

Minha única alegria é saber que da mesma maneira que foram, voltam, sempre voltam, com outra ventania inoportuna que eu adoro.

S.

domingo, 6 de maio de 2007

Entre minhas paredes

Hoje quando você ensopou meu banheiro, e fiz de conta que estava brava, percebi que gosto quando você não presta atenção se a pasta de dente acabou. Percebi que às vezes quando está frio, você nem liga de não usar nada do meu mini-cobertor.
Eu te olhava com ar de menininha apaixonada, e você sorria pra mim como se pedisse café. Um cigarro. Só pra disfarçar o quanto é tímido. Percebi o quanto nos dias em que não te vejo me dá saudade do seu desastre com as coisas ao redor e do seu apavoramento quando não estou prestando atenção no trânsito.
Quando eu fico o dia inteiro assistindo televisão na minha sala cheia de plantas engraçadas e espalhadas, eu lembro de você que de vez em quando pergunta se eu as deixo tomarem sol certinho, e se eu tenho limpado a água do peixe.
Percebi que é totalmente sem graça meu quarto escuro sem seus discos antigos com suas bandas ritmadas. E que é muito chato não ter você para não entender quando minha roupa está bonita ou não.
Continuava você ali, deixando a tampa da minha privada aberta, com o vidro todo espumado, me enchendo de perguntas bobas sobre o por que da minha mania de arrumar o banheiro toda hora. Me combrindo de elogios quando estou de calcinha branca e camiseta. Amo quando sua mão parece enorme, deslizando no meu corpo.
Te abracei como se você estivesse se declarado. Eu, a pessoa mais feliz do mundo te abraçando tão forte, tão forte, e você não entendendo nada. Meus olhos piscavam devagar enquanto você dava uma risada gostosa perguntando se eu tava bem. Depois de me dar mil estalos de beijos, daqueles que eu mais gosto, que arrepia o pescoço. Babei vendo você fazer aquele café nem doce, nem muito amargo e preparando umas torradas caseiras com orégano dourado.
Eu fixei meu olhar em cada movimento seu assimilando todos em um filme antigo que passava na minha cabeça. Um filme nosso, dos nossos dias, dos nossos momentos cheios de notas musicais.
Lembrei daquele dia em que você desceu correndo na farmácia perguntando sobre remédio de dor de ouvido, colocando até uma trilha sonora no carro pra acomodar minha dor e beijando minha orelha só para dor passar. Lembrei do dia em que você me trouxe bombom e me convidou pra ver a lua lá de cima, perto das estrelas. Ouvi nossas risadas bêbadas de vinho, aquele que deixou sua boca roxa, e que a cada risada sua eu te machucava de tanto morder. Senti seu moletom enorme me aquecendo, com nosso rock no fone de ouvido gravando nossos pensamentos iguais.
Percebi que gosto dos seus dedos macios encaixando nos meus. Me tocando pesado e ao mesmo tempo eu nem sentindo. Entre mil abraços quentes, tortos e aconchegantes que você me deu eu não mudaria nenhum. Nem um segundo a mais.
Talvez você tenha me olhado de novo daquele jeito, timído, com vergonha dos meus olhos brilharem tanto enquanto você morre de medo de encarar uma coisa que pode te levar para outro lugar.


C.

terça-feira, 1 de maio de 2007

vazio



C.

terça-feira, 24 de abril de 2007

Meio-mel Meio-sangue

Hoje ao acordar, abri bem as janelas - as mesmas que você abria toda manhã-começo-de-tarde da nossa eternidade pura. Eram daquelas de madeira, do tipo que range inteira até te arder, fazendo os olhos fecharem forte de aflição involuntária. O sol invadiu todas as minhas frestas, todas as minhas dores, todos os meus medos. Mostrou-me bem devagarzinho o queimar do sentir. E eu sentia. Muito. Eu precisava daquilo. Eu precisava da luz me descobrindo em cada poro. Mas a luz, aquela, da manhã-começo-de-tade, deixou de ser luz no exato momento em que se fez luz. A procura é sempre o motivo desconcertante das coisas. Mas a angústia impenetrável está no achar, que em si já desmerece o ato de procurar. Alcançar o indubitável faz-me doer inteirinha, dói-me até mesmo naqueles pequenos e enfadonhos pedaços que nem eu mesma sei o que querem dizer mas que dizem tanta coisa, que eu me perco nos meus próprios versos sem métrica alguma.
Dentro de uma das minhas abstrações absurdas,passeei no nosso céu. Tão azul, tão fresco, que ainda cheirava à tinta fresca. Fechei os olhos mas continuei o vendo – daquele jeito - e tive a certeza de que se você estivesse aqui ao meu lado, teria comentado algo sobre a tela daquele pintor que você tanto gosta do qual eu não me recordo o nome agora.
Senti de longe o perfume do seu sorriso, ali, tão inteiro para mim. E querida, você bem sabe, a totalidade para mim é tão inventiva quanto à felicidade plena para os poetas. Tudo fazia parte de uma mistura que continha alecrim, lírios, margaridas e hortelã. Meus preferidos. O cheiro, as cores, os suspiros trouxeram de volta as sete borboletas – que já foram tão comuns algum dia - correndo com seus encantos nos cantos perdidos do meu âmago. Borboletas não - não mais. Mariposas. Porque a dor inexistente e demasiada efêmera nunca esteve tão negra e veloz ao mesmo tempo, dentro da minha tela cheia de ares franceses pintados por outras mãos.
Passei o dia todo sentada no beiral da janela, sentindo o vento varrer meus cabelos e limpar minha alma entreaberta. Passei o dia todo com a minha profundidade perdida se afogando em um mar de sal que me ardia mais do que qualquer outra coisa. Fumei um maço inteiro daquele cigarro barato que eu odeio, mas que você esqueceu sobre a estante naquela última noite em que tudo se deu em um desfecho ácido, e quase imensurável. Cheirei todas as carreiras que pude só por saber que você não ia aprovar, como se isso fosse me tornar grande diante de você – diante de tudo - e eu me enchesse de uma grandeza vaga, que na verdade só me fez mergulhar num fundo-sem-fundo. Fiquei parada ao lado do telefone, ao lado da porta de entrada, ao lado de todas as coisas que podiam de alguma forma me levar para o meu outro lado, para fora de algo que na verdade era só meu, mas tudo o que se ouvia no meu apartamento vazio, era aquele velho disco do Dylan tocando re-pe-ti-da-men-te – Its a price I have to pay You’re a big girl all the way - na vitrola velha. Escrevi milhares de poesias desesperadas e depois botei fogo. Fiquei trocando olhares pudicos com a fumaça fina de todo o meu mais profundo individualismo, até que meus olhos se cansassem desse anestésico ingerido em doses homeopáticas – o tempo. Olhei o mesmo sol da manhã-começo-de-tarde desaparecer pedaço por pedaço no horizonte, e vi meus olhos transparentes escurecerem - lentos e breves - junto com todo o resto daquilo tudo que eu era. Daquilo tudo que eu ainda sou.
Na corda bamba, entre risos nervosos e mentiras entrelaçadas, fiz meu café. Bem forte. Quase amargo. Com muito açúcar. Deitei-me na cama - antes nossa – beirando a languidez e fiquei lá envolta por pensamentos insossos, perplexa, vendo de longe as nossas memórias enquadradas e todas aquelas pequenas epifanias.
Mais tarde, beijei a vida na boca, sentindo gota por gota da sua saliva abrasiva que sem nem perceber, tirou-me de mim mesma. Quebrada pelo instante - tão doce - em que seu olhar tombou-se sobre mim com aroma de quase-amor.

Na manhã seguinte, acordei com aquele gosto de meio-mel meio-sangue na boca. Sem saber se era pelo querer do doce, ou pelo prazer alcançado somente pelo incompreensível.


L.

quinta-feira, 19 de abril de 2007

daquele livro perdido

E em cada página de todos esses meus livros você esteve, mesmo naqueles em que eu ainda não te conhecia. Você não chegou para mim, você nasceu em mim. Nasceu feito cacto ruim que fica na vida sete vezes verde, sete vezes velho, sete vezes diferente, mas nunca deixa de ser o mesmo. Forte e armador. Caçador de psícologia intíma, psícologia avançada. Ladrão de céus arranhados, de estrelas entupidas de brilho. Apanhador de latinhas de sangue vitaminadas de vida, não de morte. Não de medo.
Com você existe um sossego agitado.
Dar a mão para à vida nunca foi tão fácil com você do meu lado, nunca foi tão bom ter um cabelo loiro-enrolado-cheirando-trigo-novo no meu colo, sendo entrelaçados pelos meus dedos malandros, traiçoeiros e que nunca deixaram de ser carinhosos.
No nosso canudo guardo os dias em baixo do pé de laranja lima da nossa casa, cada conversa, cada poesia cantada que lá fazíamos, cada confição misteriosa e engraçada que ouviamos chorando de rir, entre sombras, frios e dias ensolarados. Cada cova do meu rosto foi formada junto dos dias em que brincávamos com a mangueira no quintal, nos dias em que o almoço era o jantar e o jantar era o café da manhã. Em cada noite de núpcias que passamos juntos dos filmes antigos, entre um sonho e outro. Ser sonhadores ou não. Eu me congelei por essas acelerações.
Transformando em mim por cada dia de grito para aparecer na janela, em cada buzinada de fusca lá fora, dos dedos cortados pelas tentativas de novos molhos com cebola e dos joelhos doendo pelas brigas no sofá.
Os quadros caíram, mas continuamos lá, sorrindo ao ver que a pasta de dente acabou, que a necessaire sente falta do batom, que ficamos sem energia fazendo a carne descongelar, mas a manteiga nunca chegava perto do fim.
E eu sempre lhe tive aqui, na mão, que depois ia para o bolso, e que de vez enquando doía ao se apertar de saudade, ao precisar de mais ouvidos, de mais olhares, de mais palavras ao vento como sempre jogavámos, só para que caíssem todas certinhas onde deveria cair. Cada beliscão roxo, cada cutucada e olhar de espinho me dava ódio por tudo ser tão verdadeiro. Tão dolorido. Tão dor, tão dor, tão dor, que já nem doía mais.
Fazendo, formando, desfazendo, deformando, mas continuando sempre, sempre com o mesmo ciclo do amargo e do doce. Se aproximando a tudo: À mim. À você. E ao mundo.
Arranharão seus discos, mas para apagá-los é preciso de muito mais que isso. É mais fácil o céu cair do que você não me ver sorrir. Porque quem me fez assim não fui eu mesma, foi por cada sobremesa que eu recebi nos dias sem água. Foi por cada resposta silenciosa que você me deu nos olhos. Foi por cada noite de estrelas que você me iluminou do mar e bebeu comigo tudo que era salgado vindo de meus olhos.
Nas manhãs de pão na mesa e até das noites que não lhe via, você estava na minha saliva, no meu sangue, no meu pensamento, e apertado no meu bolso como ninguém.

Hoje lembrei da tua voz sussurando em meus ouvidos “é, por mais que meu espírito destrutivo tente destruir o tamanho e a beleza da vida, a vida é grande e bela.”, só então vi limpidamente a vida que escorre como a areia de dunas.


C.

O universo resolveu sorrir de lábios vermelhos; eu chamei de Lua.

Chamei a vida e sua canção silenciosa de inferno, de mal, agonia, de não. Esqueci do vento, da joaninha em meu estômago, dos olhos de Carolina. Blasfemei à poesia, a chamei de algema, cuspi de nojo, limpei-me de versos como quem limpa o catarro de uma gripe. Desviei os olhos das cores, do cheiro fresco da pele da menina do Vininha. Não pulei as sete ondas do sorriso de André. Não me reconheci nos abraços de quem amo. Fechei meus lábios, esqueci-me de seu doce, de seu agridoce. Fiz da minha confortável amargura, um pedestal. Emoldurei-me com uma moldura ideal, e, prostrado diante de um altar ao passado, adorei quem não sou mais, como quem monta a velha árvore de Natal empoeirada, e nela pendura bolas cintilantes, foscamente cintilantes. Me chamei de ilusão, e fechei os olhos. Evitei sonhar.

Mas acordei, e do velho retrato vou arrancar as molduras, e logo as cores da paisagem escorrerão pelas paredes, colorindo, colorido como são os dias que não mais passarão sem cor.








G.

quarta-feira, 18 de abril de 2007

saliva molhada de amor

O telefone toca e eu finjo não escutar, olho para o relógio naquela minha escrivaninha velha percebo como tudo tem passado rápido. Voando. Os raios do sol já invadiram meu quarto, já refletiram no espelho, nas paredes brancas. Na parede verde minhas fotos brilhavam e entortavam com o vento leve que vinha da janela que esqueci aberta. Lembrei do frio que fez durante a madrugada, das poucas vezes que acordei e olhei desacordada aquele céu bordado de estrelas que ganhei de presente da noite. Meus olhos piscaram devagar outra vez.
O telefone continuava soando lá da sala, e eu aqui, olhando para o porta-retrato atrás da porta, e as roupas esparramadas ao chão. Olhei para o lado e ela continuava ali intacta, parecia sonhar que estava em outra galáxia. Nem se eu passasse minhas mãos leves por aquele corpo, por aquele rosto, naquela pele branca e macia, nem se eu olhasse até doer os olhos, nem se os sinos do mundo parassem de tocar, de soar, de transbordar nas nossas orelhas frias. Nem se o sol iluminasse três vezes mais, e as manhãs de julho fizessem mais frio. Nem com a força de todas as estrelas. Nem com a força de nenhum desejo eu entraria naquele sonho lúcido que ela sonhava.
Transbordava, transbordava, transbordava. E o telefone tocava, pensei nas escovas de dentes que ainda não estava juntas. Lembrei no troco que esqueci de pegar enquanto estava bêbada, senti à dor de cabeça, senti o gosto da cerveja. Olhei para o lado, senti o beijo. Minhas costas doíam, minhas mãos dormiam.
Levantei devagar para não acordar o resto de mim que ainda dormia. Me olhei no espelho, mexi nos meus cabelos que com os raios de sol pareciam mais claros. E o telefone não parava de tocar enquanto eu procurava um cigarro perdido naquele monte de roupas fedidas de fumaça, aquelas roupas que ontem a noite foram tiradas na euforia. No tesão. No desejo. No coração palpitando. No sorriso disfarçado. No olhar cheio de flores. Lembrei dos dedos se tocando como se todo o mundo parasse. Como se o mundo girasse em forma de ciranda, uma ciranda cantada, enfeitada, e sonoramente cheia de gostos. Cheia de curvas. Cheio de fundo.
Achei o cigarro bem do lado do relógio que não cansava de marcar oito e trinta e dois, coloquei-o na boca, procurei um CD. Um ritmo calmo e solto soava em meus ouvidos na tentativa de pensar em qual CD escolher. Coloquei O Três, e com o dedilhado, com os agudos longos comecei meu dia, comecei a viver outro dia. Caminhei até a cozinha, e no caminho, em todos os cantos da casa fui abrindo as janelas. Fui soltando o ar abafado que eu tinha guardado só pra gente ontem. Doei para o mundo um pouquinho do nosso amor, um pouquinho da nossa busca. Um pouquinho da nossa loucura transformada em vida.
Mexi os lábios sem nem perceber, e enquanto preparava um café forte acendi o cigarro que ainda estava apagado em minha boca. I once fell in love with you eu cantava fechando os olhos, arrumando o pó esperando a água ferver. Olhando naquela janela suja, naquele vidro quase amarelo, as pessoas passando de carro, correndo. A cidade acordando. O trânsito nascendo. Engarrafando. Se afogando. Just because the sky turned from gray eu cantava coçando a cabeça enquanto abria a geladeira para pegar o queijo e os ovos, tirei a folhinha do calendário do mês passado, abanei a toalha da mesa, coloquei a água no pó de café e aquele cheiro maravilhoso-de-coisa-quente subiu em minhas narinas como água do mar, que engasga. Que engana. Que encanta. Into blue eu cantava olhando para aquele celeste céu azul, que até agora pouco era brilhante de estrelas, e agora só brilhava, só refletia a si mesmo. Que intercalava meus olhos confundindo minhas sensações. Eu me perdia no tempo enquanto cantava It was a good friday baixinho para não acordar meu coração que eu tinha perdido naquele lençol vermelho de ontem à noite. Que eu tinha perdido de tanto suar, de tanto gritar, de tanto dançar em passos curtos entre contrações de músculos, entre pernas frias e quentes. Entre braços fortes e dormentes. Entre desejos loucos e desejos ferventes.
O telefone voltou a tocar, enquanto isso eu preparava com gosto um café da manhã que nem eu entendia por que com tanta vontade eu fazia aquilo. Entre talheres e detalhes eu me perdi. Eu me afoguei até dar risada silênciosa. One day we'll meet cantava baixinho a outra música voltando para o quarto, olhei aquela beleza rara solta na minha cama, afundada no meio do meu lençol vermelho, fortificando meu olhar pelas cores fortes que aquele rosto pálido me é.
Comecei pelos pés, enquanto beijava-os cantava i watch you when you sleep querendo chegar logo no seu rosto. Ninguém acordava ninguém se mexia. Nem fora, nem dentro do nosso mundo. Eram só canções, eram só ondas sonoras que anestesiavam todo o momento, chocando, contemplando e abraçandoa tudo isso de uma maneira tão lilás quanto às flores que um dia joguei fora. Just to stop your eyes from falling donw tears repeti até chegar com os dedos em seu cabelo, meus olhos fechavam devagar como se fosse isso que modificasse o tempo. Como se fosse isso que atrasasse aquela bomba-relógio em cima da mesma escrivaninha, que agora mudara pra nove e sete.
Foi deslumbrante ver aqueles olhos nascendo para um novo dia, crescendo até franzir a testa, acompanhando um sorriso de bom dia até mostrar fortemente os pés-de-galinha do lado dos olhos. Beijei os olhos, as orelhas, a testa, o nariz. Mordi o queixo, limpei o rosto dos cabelos escuros cheios de nós. Em seis segundos contei as pintas, pisquei devagar, apertei as bochechas e selei nossa noite. Selei nosso encontro. Selei nossa vida. Sangrei nosso beijo.
You can leave me eu cantava servindo o café amargo, despedaçando nosso banquete sagrado. Nosso corpo doado. Nossas veias cortadas. On the corner eu cantava olhando nos olhos, lendo um silêncio de gritos, um silêncio de vícios. Uma coisa só nossa.
Where you found me eu cantava acendendo outro cigarro, soltando a fumaça para o alto, pensando nas luzes que os azulejos faziam, pensando no outono que acabava lá fora. Uma borboleta entrou roxiando minha cozinha, cheirando cereja velha, trazendo ruídos que rimavam com o bater até das minhas asas.
O céu bordado de estrelas ontem, o de hoje transbordando saliva molhada de amor, i'm not for sale anymore cantei fechando os olhos e acordando para mais um dia de fantasia até o telefone voltar à tocar.


C.

quinta-feira, 12 de abril de 2007

Acordei feliz


Sorrir. Sorrir. Sorrir. – uma borboleta soou em meus ouvidos. Anestesiou a minha mente e tocou quase todo o cor-de-rosa que existe dentro de mim, vibrando cada parte cheia de casca grotesca e apagada dentro do meu corpo.
Me sacudia por dentro, e meus olhos vibravam e soluçavam em danças não sentidas. Meus lábios também amortecidos era banhado pela minha saliva grossa e adocicada de uva.
Perdi os movimentos dos ombros e o mundo parou de pesar nas minhas costas, meus dedos entrelaçavam pelos meus cabelos sem nenhuma força. E cada movimento era brilhante deixando um rastro como uma estrela cadente.
O ar entrava em meus pulmões, fazia toda volta pelo meu corpo, passando pelo meu sangue roxo e voltava como um labirinto sem paredes.
Senti meus lábios se mexendo e imaginei ser um sorriso pelo sol, talvez pela marca branca parecida com uma maçã mordida naquele céu-azul-celeste, visto pelo foco dos meus olhos embaçados de amor.
Um amor que não existia, mas que mesmo assim, era saboroso.
A brisa batia com força na minha pela escura de sol, fazendo música de chuva caindo em manhã de domingo.
Fechei meus olhos com força, e quando vi, não estava mais ali. Nada disso havia acontecido.
Acordei feliz. Me vi sorrir.


C.

quarta-feira, 11 de abril de 2007

Fragmentos

Parece que agora a questão passou de vida ou morte por ter atingido minh'alma, por ter tocado no fundo, doído no fundo, e principalmente, por ter sangrado tanto.

Ainda sinto que não sou mais sombra dos dias, mas parece que meu corpo pesou, e sobre meus diversos sorrisos pousaram maripousas mortas pelo pecado. Pelo meu pecado.
E o que sobrou do meu coração, foi o caroço. Caroço daquela pêra doce e saborosa que comi rápido demais.

Fragmentos doloridos de um dia sem braços, sem pernas e principalmente sem olhos.


C.

Não é felicidade, é loucura.

oaiuepoiujoincuheghfhdeucheiudhjhbyagwsdbleibcaydbuaybjfhbkveycgecybjhvsbdoijeopijeibkveycgecybjhvsbdoijeopijei
asjdnbieucbieucheiycgeybueyvcuiaevicutvaeutcveaitiayetvcaiyetdw78df743fridfuvb4habsdbkveycgecybjhvsbdoijeopijei
aibxcoiaebcouayebovycouaveuycuydvcudvcjdhvcljdhvlcjhvdljdhvljhvdlchdljchvaldjchvldjchabkveycgecybjhvsbdoijeopijei
asnciuecbiebciuebcieubciudhfpodhfodhodhpoasdhpaosdhpaoishdhasiduhipuyaicueypowiyepobkveycgecybjhvsbdoijeopijei
aeouoxeiupfoeiufoiueçofixuçoiuçfoxeifufoiaefoeuhfehoduhedeiudhieudhpeihdpehdpehdoeuhdbkveycgecybjhvsbdoijeopijei
eoiuapeoijaedoeidjeoijdopaeiduebpofy9wy9wy9028yf9y49yoiuwfyiya97wefy9w987y497yfopbkveycgecybjhvsbdoijeopijei


Me sinto assim, da altura do chão, cheio de incertezas. Foi como um disparo, como extase, inesquecível e duradouro por certo tempo, agora acabou.


D.

terça-feira, 10 de abril de 2007

... e estar cada vez mais orvalho. Não, sereno.

...

sexta-feira, 6 de abril de 2007



Esta é a minha forma de dizer.
N.

Abril

"Sinto o abraço do tempo apertar e redesenhar minhas escolhas.
Logo eu que queria mudar tudo me vejo cumprindo ciclos, gostar mais de hoje e gostar disso.
Me vejo com seus olhos, tempo espero pelas novas folhas. Imagino jeitos novos para as mesmas coisas, logo eu que queria ficar pra ver encorparem os caules.
Lá vou eu, eu queria ficar pra me ver mais tarde, sabendo o que sabem os velhos. Pra ver o tempo e seu lento ácido dissolver o que é concreto.
E vejo o tempo em seu claroescuro , vejo o tempo em seu movimento que me marcar a pele fundo, me impelindo, me fazendo. Logo eu que fazia girar o mundo. Logo eu, quem diria, esperar pelos frutos.
Conheço o tempo em seus disfarces, em seus círculos de horas, se arrastando feito meses se o meu amor demora. E vejo bem tudo recomeçar todas as vezes. E vejo o tempo apodrecer e brotar e seguir sendo sempre ele. E o tempo todo começar de novo, e ser, e ter tudo pela frente."

A doença.

Silêncio.
Vou tirar da minha boca quarenta motivos de dor.
Vou falar alto, bêbado de sonhos, todos os versos de poesia que me sorrirem. E depois, marca-los com meu nome, este nome que jogaram em mim.
Vou erguer meu queixo sobre o resto de minha nudez juvenil e deixar-me ser belo. Me largarei para beleza, esta, cujo tamanho e crueldade são ilimitados. Estarei possuído de mim, e me possuirei assim, morto, vivo, morto-vivo da vida morta.
Vou suprir as faltas com o prazer, me envenenarei de prazer. E, envenenado, louco, íntimo de minha podridão, morrerei, mas vou morrer de vida.




G.

quinta-feira, 5 de abril de 2007

Branca, Lua, Preta!

É assim, mais ou menos assim.
As pessoas se aquietam e ficam sóbrias, há um silêncio profundo nesse lugar. O barulho das árvores é como aquela velha música que toca na nossa vitrola, é, na nossa vitrola. É como se nenhum sentimento existisse aqui dentro de mim, como se tudo tivesse parado e eu estivesse apenas respirando e ainda trabalhando todas as articulações do meu corpo. É como partir e morrer. Não estar. Um dia nada. Um dia sem sentimentos, sem abraços, sem ninguém, sem melancolia. Não tendo pra onde fugir, muito menos onde se esconder, a não ser em si próprio. Naquele lugar que só você conhece, onde tudo pode, onde tudo é inocente. É verdadeiro.

A privada aqui é toda suja, com um fundo preto. Cheia de merda, cheia de vômitos. Das tantas coisas que cansam as pessoas, das tantas amarguras, das tantas inseguranças, dos tantos medos, enfim, dos tantos que não foram aproveitados, ou aproveitados demais. Tanta coisa já aconteceu e eu só vi passar. Nuvens de algodão, bolas de papel, pipas ao ar, pirulitos coloridos, mas nunca me deixei ser aquela criança, que sonha, que pensa no futuro, que tem como princípio, ser feliz, apenas ser feliz. Não, eu quis tudo ao contrário. Tudo errado? Não sei se errado. Pra essa sociedade podre, sim. Mas, para nós, não. É agora e é pra sempre. É como se estivéssemos aproveitando todos os momentos, como se fossem o último. É mostrar-se amigo, é ter amigos.
Eu tento fugir dos olhares do mundo, me esconder a todo instante. Não é bobeira, eles não aceitariam. Não é forte e nem oprimido.

Cada eco leva uma voz adiante. Qualquer traço, linha, ponto de fuga. Qualquer pedaço que se mova, qualquer.
QUALQUER COISA, ALGUÉM AÍ ENTENDE? É CANSAÇO!


d.

Desconserto em palavras.

A brisa do outono caia como luvas em cada traço marcante dos caminhos que vazia aquele corpo de menina moça. Abriu a janela pra sacada, e ficou ali por quase uma hora, analisando o poder da manhã de domingo. Analisando como as ruas eram pouco movimentadas nesse horário, nesse dia. Por pouco não escutava o grito sonolento de cada folha que despencava levemente das árvores, que pelo vento fraco da manhã fazia com que elas flutuassem mais ainda, naquele ar de areia marinha que não existia ali. Alguns passos apressados, alguns cachorros abandonados.
O sol brilhava feito aquele ultimo dia de amor em setembro, queimando por de baixo daquela pele fresca, cheirando sorvete de uva ao creme. Irradiando a face até que os olhos se apertassem e ficassem completamente pequenos, formando diversas caretas amargas. O céu transbordava dezenas de azuis escaldantes, e do lado direito às pintas da bochecha se confundiam com as últimas estrelas avistadas no céu. No céu de ontem.
Ela conquistava cada dó menor, cada fá sustenido e cada lá com sol, que vinha junto daquela canção antiga, dos tempos de cabelo comprido, dos tempos em que viver era só sonhar, daquele carro barulhento, cheio de fumaça de cigarro. Devia ser no vinte e quatro ou vinte e cinco que o volume abafava o som enfraquecido daquele solo de guitarra da música No Rain.
Lá de cima ela também avistava o vago da cidade, onde os lugares ainda eram cobertos daquele cimento verde, onde o orvalho cai todas as noites e molha. Onde antigamente ela colocava a toalha colorida para ficar dando nomes a estrelas que ela nem mesma conhecia, fumando um cigarro fraco e mergulhando em fantasias pré-históricas. Cheias de sabores freneticamente lambidos por sensações anestesiadas pela vontade de se afogar em um mar salgadamente doce. Até o dia nascer, até o sono bater. Sem ou com moletom, naquele cimento de antigamente, onde agora quase não tem espaços verdes, muitos menos verde-musgo.
Sentia saudade de lá enquanto o vento e o tempo passavam, como tem passado os anos, despercebidos. Rápidos demais. Com "para sempres" excessivos e sem sabores.
Fechou os olhos, bateu os pés, e quando abriu foi logo despistando o olhar daqueles pássaros que voavam para o país das maravilhas, longe daqui. Longe daí. Longe de mim. Longe de tudo. E principalmente dela.
Desceu as escadas e no jardim foi procurar flores que morriam e que nasciam por causa da estação. Borboletas circulavam entre suas cores fortes, e em uma dança típica de outono. O tempo foi passando despercebido outra vez. Encantando não só a ela, mais as pessoas que passavam na rua, e com olhos longos enxergavam cada passo flutuante que ela girava, naquela ciranda imaginaria, naquela corda-bamba invisível, em cada piscar demorado mexendo os cabelos cacheados de mel, envolvidos por fel. E entre a sombra e o amarelo brilhante, ela gritava um silêncio entorpecente de palavras cheio de enigmas lunáticos, como se resolvesse jogos de xadrez sem nem pensar. Ela flutuava com os pés no chão, mas como pipas longes, e coloridas de prazer pelo vento mais fresco e limpo de lá. Lá de cima. Lá do céu. Lá das nuvens mais altas. E do sol. E da lua. E da onde quer que fosse o pico mais alto o sorriso dela encaixava com cada centímetro de vida que eu ouvia a aurora nos dias de inverno, mesmo que o gosto fosse o outono.

Aquela bailarina com o doce de pele adocicando o ar, com as cores tóxicas do amor, do sabor, do prazer. Anestesiada de vida.

- Viver é não saber não rir.


C.

quarta-feira, 4 de abril de 2007

A verdade em branco e preto

Vejo as cores. Aquelas. Recheadas de mentiras sinceras, cheias de sorrisos largos, ora desconcertantes, ora desconcentrados. Vejo o céu – ah o céu. Alguém havia reparado na profundidade arrebatadora que possui o céu hoje? Roxo e vermelho. Dizem que roxo e vermelho é a cor da perdição. Roxo e vermelho. Quero é me perder, só para poder sentir a poesia errar de veia no ato de me encontrar. Perco-me entre as nuvens de baunilha do céu de Monet e me misturo no surrealismo ácido de Dalí. Danço feita bailarina torta por entre os caminhos de Oz, corro do monstro da torre do Orco, despedaço-me como pétalas secas sob o sol escaldante do meio-dia, e nasço, ou melhor, renasço no orvalho quente-frio de cada manhã. Sinto, agora, no silêncio da escuridão, o vento dançando, leve, sobre meus cabelos, me envolvendo, me desenhando, colocando em ordem frase por frase bagunçada entre meus versos aleatórios e sem fôlego.Perfeição beirando a não-lucidez. As cores. As brisas. As sensações.Sinto-me a protagonista de uma música do Chico. Roda viva. Ou quem sabe uma das mulheres de Vinicius. Isso. Sou a própria menina com uma flor. Flor de Lírio. Entro na sala de espelhos, olho para um deles e desafio a me amar. No frêmito entre uma respiração e outra, o cheiro de poesia misturado com o gosto do álcool, preso como unha e carne entre os meus lábios, se desenrolava, breve, sobre o meu corpo. Sentia cada fisgada, amarga, de prazer. Sentia cada dor, pura, do à-flor-da-pele. Sentia cada gota d’água, uma por uma, transbordar além do acima do além sobre mim. Morro de vontade, seco de desejo e ardo. Dói-me arder toda. Mas é doce sentir o arder. Então ardo. Transbordarder.

Vejo os tons coloridos, todos em preto e branco. Sorrisos contraídos e contrários. Vejo o céu, metade cinza. Quantos versos vazios serão precisos para me fazer espatifar no chão como Lolita após escutar todas as manhãs – luz da minha vida, labareda em minha carne? Tão vazio, tão fundo-sem-fundo. Me vejo no reflexo do olhar de Monalisa, e me reflito junto ao seu abstrato perdido em algum lugar que eu não sei onde fica. Os milhões de vasos sem nenhuma flor padecem sobre minha varanda cercados da imensidão vaga dos vaga-lumes. Sento naquele balanço, já velho, e fico vendo o tempo passar feito um cigarro queimando, vendo a vida escorrer feito aquela gota d’água que um dia transbordou em uma rima, ácida, nas minhas profundidades. Não há lírios. Há só alguns vestígios, tão pequeninos, de poesia que ás vezes aparecem em um ruflar de asas de borboletas, perdidas, no meu estômago.
De toda aquela coleção de eternidades pífias e semi-puras que possuíam aquele gosto eterno de nunca e de pra sempre - meio-doce meio-amargo - a única que ainda está aqui, intacta, é a sala de espelhos, onde eu me olho, enfrento-me, quase me ardo, que me deixa muda - de corpo e e de alma - apresentando-me uma nova versão, rude, da mesma coisa. E tudo o que eu consigo enxergar é uma uma mancha desfigurada, das cores, daquelas cores, minhas, de Picasso, talvez de Tarsila, cores de Frida Kahlo, todas - pasmem - em preto e branco.

Open your eyes;




L.

Contato Imediato

Peço por favor, se alguém de longe me escutar, que venha aqui pra me buscar.

Me leve para passear no seu disco voador, como um enorme carrossel atravessando o azul do céu até pousar no meu quintal.

Se o pensamento duvidar todos os meus poros vão dizer: Estou pronto para embarcar sem me preocupar e sem temer.

Vem me levar para um lugar, longe daqui. Livre para navegar no espaço sideral.

Porque sei que sou semelhante de você. Diferente de você. Passageiro de você. À espera de você.
No seu balão de são joão que caia bem na minha mão, ou numa pipa de papel me leve para além do céu.

Se o coração disparar quando eu levantar os pés do chão, a imensidão vai me abraçar e acalmar a minha pulsação

Longe de mim. Solto no ar. Dentro do amor. Livre para navegar. Indo para onde for o seu disco voador.




Arnaldo Antunes /Marisa Monte /Carlinhos Brown.

C.

Carta resposta aos amantes da melancolia

Eu espero sinceramente que por debaixo dos olhos tristes e do sorriso ausente escondam-se infinitos prazeres, e que nos paradoxos doloridos estejam os abraços mais acalantadores.
O acalanto do aventureiro é a aventura.

Nos sonhos cheios de adrenalina com cores do país das maravilhas, Alice grita do inferno de si mesma, pedindo socorro à quem sonha: "Liberte-me da segurança do que conheço!!"

Conheçer-me de nada vale, a não ser evitar a surpresa da temível loucura.
Enganar-me é não saber até onde vou? Enganar-me é acreditar que este limite possa existir.

Talvez seja hora de desistir. Desistir de encontrar o ponto em que a fruta se despedaça, se revela, e morder, estuprar sem pudor a si mesmo. Gastar-se com o gosto de quem morde a própria pêra, de quem não tem medo de ter fome.



E ao ter fome, coma o que tem: A fome.


G.

Trancafiança

O duro desses meus pensamentos nublados e quietos, é que dentro de mim eu me fecho. Crio barreiras. Me torno invisível.
Para mim não adianta mais fechar os olhos com força, fazendo pensamento para que tudo volte ao normal. Não, não adianta mais. Meus pés não saem mais do chão com tanta facilidade. Eu não voou. Eu não flutuo mais dentro do mar-de-rosas-lilases-com-cheiro-de-purpurinas-brilhantes.
Me afoguei depois de um dia cansativo de tristezas no meu quarto escuro, fechando a porta para o mundo. Joguei minhas dores nas almofadas e junto delas saíram algumas lágrimas involuntárias. Eu adormeci em um sono fundo e pesado, sonhei com coisas inexplicáveis e acordei sorrindo.
Depois desse dia cansativo de tristezas, eu passei a todos os dias ter dias iguais. E dia após dia fui enferrujando meus lábios de álcool, enferrujando meu sorrido avassalador, enferrujando meus olhos-com-brilho-de-quero-mais, enferrujando meu jeito e o meu não-jeito. Não dei conta de mim, e agora vi o tanto estou perdida. Com medo até da chuva que pode cair lá fora e que à tempo não vejo. E que à tempo não saboreio.
As músicas não fazem mais sentido algum. Nenhum som ecoa nos meus ouvidos dançando. Nenhuma borboleta colorida samba em passos firmes dentro de mim. Nenhum gosto doce vem a minha boca quando lembro de alguém.
Ouvi dizer que quando não se suporta mais o cheiro, o amor também não suporta mais nada. E foi exatamente assim comigo.
Não me fiz forte o suficiente para que minhas narinas respirassem aquele cheiro-forte-azedo-enjoativo-e-obscuro, e me afoguei em um jogo chamado quebra-cabeça-do-adeus. E com o passar dos dias, eu aqui, trancafiada dentro do meu quarto vago, cheio de promessas para o futuro que não existe, cheio de fotos antigas carregadas de saudade vazia, cheio de mofo limpo com gosto de chuva ácida, cheio de dores compostas, cheio de roupas coloridas para um dia chamado nunca mais. Cheia de tempestades de sol no escuro.
E completamente ou incompletamente cheia-desses-dias-sem-amor.




C.

terça-feira, 3 de abril de 2007

Sempre soube.

Cadê a minha vala? Meu fundo do poço?
Cadê o meu caminho? Meus muros? Minhas mentiras?
Onde estão as minhas desculpas, os meus anseios?
Quando foi que esqueci que deixei tudo para trás?

Se antes eu me perdia na mentira, agora não me acho na verdade. Não me enxergam nela. Ela se vinga de mim dissimulando e mentindo descarademente, assim como eu, que um dia cansei de mentir usando apenas verdades dissimuladas.

E eu me vejo na beira do precipício outra vez, aquele que todo mundo fala, aquele que todo mundo quer ter pra si mesmo que seja pra dizer que não sabia se pulava ou se dava meia volta, aquele que um dia eu pulei, que jurei nao querer ver na minha frente. Tudo porque eu não pulo pra cair. Mas sempre caio.

Esse é o meu karma, essa é a minha sina.
Mas esse é o precipício da contradição, o desejo de todo suicida arrependido, inclusive o meu.

S.

segunda-feira, 2 de abril de 2007

Efêmera Existência.

Muitos passavam e nem sequer a percebiam, envolvidos em seus dramas particulares ignoravam o fortuito e se casavam com o óbvio para se tornarem um pouco mais egoístas.

Já nao se sabia o que era o que, não se entregava totalmente mas ali permanecia, se desmanchando com o passar das horas, se desfazendo com o sopro do vento e com o calor do sol, ansiando em ser o que estava estampado na sua cara, ou não.


Sabia que seu tempo era contado, ela era mais uma daquelas que nasceram para morrer, daquelas que ficam agonizando seus dias porque sabem que no final não fica nada pra contar história e porque nem suas próprias histórias podem contar.

Então ela se deixa levar, se deixa secar, se deixa morrer esperando que ninguém lhe pise na cara ou em qualquer outro lugar que a faça desaparecer mais rápido.

A sarjeta é sua melhor amiga e sempre será, ela sim sabe das coisas, sempre esteve onde está e já cansou de ver muitas outras com esse mesmo destino.

Destino cruel de nascer, mal viver e já morrer.




S.