terça-feira, 24 de abril de 2007

Meio-mel Meio-sangue

Hoje ao acordar, abri bem as janelas - as mesmas que você abria toda manhã-começo-de-tarde da nossa eternidade pura. Eram daquelas de madeira, do tipo que range inteira até te arder, fazendo os olhos fecharem forte de aflição involuntária. O sol invadiu todas as minhas frestas, todas as minhas dores, todos os meus medos. Mostrou-me bem devagarzinho o queimar do sentir. E eu sentia. Muito. Eu precisava daquilo. Eu precisava da luz me descobrindo em cada poro. Mas a luz, aquela, da manhã-começo-de-tade, deixou de ser luz no exato momento em que se fez luz. A procura é sempre o motivo desconcertante das coisas. Mas a angústia impenetrável está no achar, que em si já desmerece o ato de procurar. Alcançar o indubitável faz-me doer inteirinha, dói-me até mesmo naqueles pequenos e enfadonhos pedaços que nem eu mesma sei o que querem dizer mas que dizem tanta coisa, que eu me perco nos meus próprios versos sem métrica alguma.
Dentro de uma das minhas abstrações absurdas,passeei no nosso céu. Tão azul, tão fresco, que ainda cheirava à tinta fresca. Fechei os olhos mas continuei o vendo – daquele jeito - e tive a certeza de que se você estivesse aqui ao meu lado, teria comentado algo sobre a tela daquele pintor que você tanto gosta do qual eu não me recordo o nome agora.
Senti de longe o perfume do seu sorriso, ali, tão inteiro para mim. E querida, você bem sabe, a totalidade para mim é tão inventiva quanto à felicidade plena para os poetas. Tudo fazia parte de uma mistura que continha alecrim, lírios, margaridas e hortelã. Meus preferidos. O cheiro, as cores, os suspiros trouxeram de volta as sete borboletas – que já foram tão comuns algum dia - correndo com seus encantos nos cantos perdidos do meu âmago. Borboletas não - não mais. Mariposas. Porque a dor inexistente e demasiada efêmera nunca esteve tão negra e veloz ao mesmo tempo, dentro da minha tela cheia de ares franceses pintados por outras mãos.
Passei o dia todo sentada no beiral da janela, sentindo o vento varrer meus cabelos e limpar minha alma entreaberta. Passei o dia todo com a minha profundidade perdida se afogando em um mar de sal que me ardia mais do que qualquer outra coisa. Fumei um maço inteiro daquele cigarro barato que eu odeio, mas que você esqueceu sobre a estante naquela última noite em que tudo se deu em um desfecho ácido, e quase imensurável. Cheirei todas as carreiras que pude só por saber que você não ia aprovar, como se isso fosse me tornar grande diante de você – diante de tudo - e eu me enchesse de uma grandeza vaga, que na verdade só me fez mergulhar num fundo-sem-fundo. Fiquei parada ao lado do telefone, ao lado da porta de entrada, ao lado de todas as coisas que podiam de alguma forma me levar para o meu outro lado, para fora de algo que na verdade era só meu, mas tudo o que se ouvia no meu apartamento vazio, era aquele velho disco do Dylan tocando re-pe-ti-da-men-te – Its a price I have to pay You’re a big girl all the way - na vitrola velha. Escrevi milhares de poesias desesperadas e depois botei fogo. Fiquei trocando olhares pudicos com a fumaça fina de todo o meu mais profundo individualismo, até que meus olhos se cansassem desse anestésico ingerido em doses homeopáticas – o tempo. Olhei o mesmo sol da manhã-começo-de-tarde desaparecer pedaço por pedaço no horizonte, e vi meus olhos transparentes escurecerem - lentos e breves - junto com todo o resto daquilo tudo que eu era. Daquilo tudo que eu ainda sou.
Na corda bamba, entre risos nervosos e mentiras entrelaçadas, fiz meu café. Bem forte. Quase amargo. Com muito açúcar. Deitei-me na cama - antes nossa – beirando a languidez e fiquei lá envolta por pensamentos insossos, perplexa, vendo de longe as nossas memórias enquadradas e todas aquelas pequenas epifanias.
Mais tarde, beijei a vida na boca, sentindo gota por gota da sua saliva abrasiva que sem nem perceber, tirou-me de mim mesma. Quebrada pelo instante - tão doce - em que seu olhar tombou-se sobre mim com aroma de quase-amor.

Na manhã seguinte, acordei com aquele gosto de meio-mel meio-sangue na boca. Sem saber se era pelo querer do doce, ou pelo prazer alcançado somente pelo incompreensível.


L.

quinta-feira, 19 de abril de 2007

daquele livro perdido

E em cada página de todos esses meus livros você esteve, mesmo naqueles em que eu ainda não te conhecia. Você não chegou para mim, você nasceu em mim. Nasceu feito cacto ruim que fica na vida sete vezes verde, sete vezes velho, sete vezes diferente, mas nunca deixa de ser o mesmo. Forte e armador. Caçador de psícologia intíma, psícologia avançada. Ladrão de céus arranhados, de estrelas entupidas de brilho. Apanhador de latinhas de sangue vitaminadas de vida, não de morte. Não de medo.
Com você existe um sossego agitado.
Dar a mão para à vida nunca foi tão fácil com você do meu lado, nunca foi tão bom ter um cabelo loiro-enrolado-cheirando-trigo-novo no meu colo, sendo entrelaçados pelos meus dedos malandros, traiçoeiros e que nunca deixaram de ser carinhosos.
No nosso canudo guardo os dias em baixo do pé de laranja lima da nossa casa, cada conversa, cada poesia cantada que lá fazíamos, cada confição misteriosa e engraçada que ouviamos chorando de rir, entre sombras, frios e dias ensolarados. Cada cova do meu rosto foi formada junto dos dias em que brincávamos com a mangueira no quintal, nos dias em que o almoço era o jantar e o jantar era o café da manhã. Em cada noite de núpcias que passamos juntos dos filmes antigos, entre um sonho e outro. Ser sonhadores ou não. Eu me congelei por essas acelerações.
Transformando em mim por cada dia de grito para aparecer na janela, em cada buzinada de fusca lá fora, dos dedos cortados pelas tentativas de novos molhos com cebola e dos joelhos doendo pelas brigas no sofá.
Os quadros caíram, mas continuamos lá, sorrindo ao ver que a pasta de dente acabou, que a necessaire sente falta do batom, que ficamos sem energia fazendo a carne descongelar, mas a manteiga nunca chegava perto do fim.
E eu sempre lhe tive aqui, na mão, que depois ia para o bolso, e que de vez enquando doía ao se apertar de saudade, ao precisar de mais ouvidos, de mais olhares, de mais palavras ao vento como sempre jogavámos, só para que caíssem todas certinhas onde deveria cair. Cada beliscão roxo, cada cutucada e olhar de espinho me dava ódio por tudo ser tão verdadeiro. Tão dolorido. Tão dor, tão dor, tão dor, que já nem doía mais.
Fazendo, formando, desfazendo, deformando, mas continuando sempre, sempre com o mesmo ciclo do amargo e do doce. Se aproximando a tudo: À mim. À você. E ao mundo.
Arranharão seus discos, mas para apagá-los é preciso de muito mais que isso. É mais fácil o céu cair do que você não me ver sorrir. Porque quem me fez assim não fui eu mesma, foi por cada sobremesa que eu recebi nos dias sem água. Foi por cada resposta silenciosa que você me deu nos olhos. Foi por cada noite de estrelas que você me iluminou do mar e bebeu comigo tudo que era salgado vindo de meus olhos.
Nas manhãs de pão na mesa e até das noites que não lhe via, você estava na minha saliva, no meu sangue, no meu pensamento, e apertado no meu bolso como ninguém.

Hoje lembrei da tua voz sussurando em meus ouvidos “é, por mais que meu espírito destrutivo tente destruir o tamanho e a beleza da vida, a vida é grande e bela.”, só então vi limpidamente a vida que escorre como a areia de dunas.


C.

O universo resolveu sorrir de lábios vermelhos; eu chamei de Lua.

Chamei a vida e sua canção silenciosa de inferno, de mal, agonia, de não. Esqueci do vento, da joaninha em meu estômago, dos olhos de Carolina. Blasfemei à poesia, a chamei de algema, cuspi de nojo, limpei-me de versos como quem limpa o catarro de uma gripe. Desviei os olhos das cores, do cheiro fresco da pele da menina do Vininha. Não pulei as sete ondas do sorriso de André. Não me reconheci nos abraços de quem amo. Fechei meus lábios, esqueci-me de seu doce, de seu agridoce. Fiz da minha confortável amargura, um pedestal. Emoldurei-me com uma moldura ideal, e, prostrado diante de um altar ao passado, adorei quem não sou mais, como quem monta a velha árvore de Natal empoeirada, e nela pendura bolas cintilantes, foscamente cintilantes. Me chamei de ilusão, e fechei os olhos. Evitei sonhar.

Mas acordei, e do velho retrato vou arrancar as molduras, e logo as cores da paisagem escorrerão pelas paredes, colorindo, colorido como são os dias que não mais passarão sem cor.








G.

quarta-feira, 18 de abril de 2007

saliva molhada de amor

O telefone toca e eu finjo não escutar, olho para o relógio naquela minha escrivaninha velha percebo como tudo tem passado rápido. Voando. Os raios do sol já invadiram meu quarto, já refletiram no espelho, nas paredes brancas. Na parede verde minhas fotos brilhavam e entortavam com o vento leve que vinha da janela que esqueci aberta. Lembrei do frio que fez durante a madrugada, das poucas vezes que acordei e olhei desacordada aquele céu bordado de estrelas que ganhei de presente da noite. Meus olhos piscaram devagar outra vez.
O telefone continuava soando lá da sala, e eu aqui, olhando para o porta-retrato atrás da porta, e as roupas esparramadas ao chão. Olhei para o lado e ela continuava ali intacta, parecia sonhar que estava em outra galáxia. Nem se eu passasse minhas mãos leves por aquele corpo, por aquele rosto, naquela pele branca e macia, nem se eu olhasse até doer os olhos, nem se os sinos do mundo parassem de tocar, de soar, de transbordar nas nossas orelhas frias. Nem se o sol iluminasse três vezes mais, e as manhãs de julho fizessem mais frio. Nem com a força de todas as estrelas. Nem com a força de nenhum desejo eu entraria naquele sonho lúcido que ela sonhava.
Transbordava, transbordava, transbordava. E o telefone tocava, pensei nas escovas de dentes que ainda não estava juntas. Lembrei no troco que esqueci de pegar enquanto estava bêbada, senti à dor de cabeça, senti o gosto da cerveja. Olhei para o lado, senti o beijo. Minhas costas doíam, minhas mãos dormiam.
Levantei devagar para não acordar o resto de mim que ainda dormia. Me olhei no espelho, mexi nos meus cabelos que com os raios de sol pareciam mais claros. E o telefone não parava de tocar enquanto eu procurava um cigarro perdido naquele monte de roupas fedidas de fumaça, aquelas roupas que ontem a noite foram tiradas na euforia. No tesão. No desejo. No coração palpitando. No sorriso disfarçado. No olhar cheio de flores. Lembrei dos dedos se tocando como se todo o mundo parasse. Como se o mundo girasse em forma de ciranda, uma ciranda cantada, enfeitada, e sonoramente cheia de gostos. Cheia de curvas. Cheio de fundo.
Achei o cigarro bem do lado do relógio que não cansava de marcar oito e trinta e dois, coloquei-o na boca, procurei um CD. Um ritmo calmo e solto soava em meus ouvidos na tentativa de pensar em qual CD escolher. Coloquei O Três, e com o dedilhado, com os agudos longos comecei meu dia, comecei a viver outro dia. Caminhei até a cozinha, e no caminho, em todos os cantos da casa fui abrindo as janelas. Fui soltando o ar abafado que eu tinha guardado só pra gente ontem. Doei para o mundo um pouquinho do nosso amor, um pouquinho da nossa busca. Um pouquinho da nossa loucura transformada em vida.
Mexi os lábios sem nem perceber, e enquanto preparava um café forte acendi o cigarro que ainda estava apagado em minha boca. I once fell in love with you eu cantava fechando os olhos, arrumando o pó esperando a água ferver. Olhando naquela janela suja, naquele vidro quase amarelo, as pessoas passando de carro, correndo. A cidade acordando. O trânsito nascendo. Engarrafando. Se afogando. Just because the sky turned from gray eu cantava coçando a cabeça enquanto abria a geladeira para pegar o queijo e os ovos, tirei a folhinha do calendário do mês passado, abanei a toalha da mesa, coloquei a água no pó de café e aquele cheiro maravilhoso-de-coisa-quente subiu em minhas narinas como água do mar, que engasga. Que engana. Que encanta. Into blue eu cantava olhando para aquele celeste céu azul, que até agora pouco era brilhante de estrelas, e agora só brilhava, só refletia a si mesmo. Que intercalava meus olhos confundindo minhas sensações. Eu me perdia no tempo enquanto cantava It was a good friday baixinho para não acordar meu coração que eu tinha perdido naquele lençol vermelho de ontem à noite. Que eu tinha perdido de tanto suar, de tanto gritar, de tanto dançar em passos curtos entre contrações de músculos, entre pernas frias e quentes. Entre braços fortes e dormentes. Entre desejos loucos e desejos ferventes.
O telefone voltou a tocar, enquanto isso eu preparava com gosto um café da manhã que nem eu entendia por que com tanta vontade eu fazia aquilo. Entre talheres e detalhes eu me perdi. Eu me afoguei até dar risada silênciosa. One day we'll meet cantava baixinho a outra música voltando para o quarto, olhei aquela beleza rara solta na minha cama, afundada no meio do meu lençol vermelho, fortificando meu olhar pelas cores fortes que aquele rosto pálido me é.
Comecei pelos pés, enquanto beijava-os cantava i watch you when you sleep querendo chegar logo no seu rosto. Ninguém acordava ninguém se mexia. Nem fora, nem dentro do nosso mundo. Eram só canções, eram só ondas sonoras que anestesiavam todo o momento, chocando, contemplando e abraçandoa tudo isso de uma maneira tão lilás quanto às flores que um dia joguei fora. Just to stop your eyes from falling donw tears repeti até chegar com os dedos em seu cabelo, meus olhos fechavam devagar como se fosse isso que modificasse o tempo. Como se fosse isso que atrasasse aquela bomba-relógio em cima da mesma escrivaninha, que agora mudara pra nove e sete.
Foi deslumbrante ver aqueles olhos nascendo para um novo dia, crescendo até franzir a testa, acompanhando um sorriso de bom dia até mostrar fortemente os pés-de-galinha do lado dos olhos. Beijei os olhos, as orelhas, a testa, o nariz. Mordi o queixo, limpei o rosto dos cabelos escuros cheios de nós. Em seis segundos contei as pintas, pisquei devagar, apertei as bochechas e selei nossa noite. Selei nosso encontro. Selei nossa vida. Sangrei nosso beijo.
You can leave me eu cantava servindo o café amargo, despedaçando nosso banquete sagrado. Nosso corpo doado. Nossas veias cortadas. On the corner eu cantava olhando nos olhos, lendo um silêncio de gritos, um silêncio de vícios. Uma coisa só nossa.
Where you found me eu cantava acendendo outro cigarro, soltando a fumaça para o alto, pensando nas luzes que os azulejos faziam, pensando no outono que acabava lá fora. Uma borboleta entrou roxiando minha cozinha, cheirando cereja velha, trazendo ruídos que rimavam com o bater até das minhas asas.
O céu bordado de estrelas ontem, o de hoje transbordando saliva molhada de amor, i'm not for sale anymore cantei fechando os olhos e acordando para mais um dia de fantasia até o telefone voltar à tocar.


C.

quinta-feira, 12 de abril de 2007

Acordei feliz


Sorrir. Sorrir. Sorrir. – uma borboleta soou em meus ouvidos. Anestesiou a minha mente e tocou quase todo o cor-de-rosa que existe dentro de mim, vibrando cada parte cheia de casca grotesca e apagada dentro do meu corpo.
Me sacudia por dentro, e meus olhos vibravam e soluçavam em danças não sentidas. Meus lábios também amortecidos era banhado pela minha saliva grossa e adocicada de uva.
Perdi os movimentos dos ombros e o mundo parou de pesar nas minhas costas, meus dedos entrelaçavam pelos meus cabelos sem nenhuma força. E cada movimento era brilhante deixando um rastro como uma estrela cadente.
O ar entrava em meus pulmões, fazia toda volta pelo meu corpo, passando pelo meu sangue roxo e voltava como um labirinto sem paredes.
Senti meus lábios se mexendo e imaginei ser um sorriso pelo sol, talvez pela marca branca parecida com uma maçã mordida naquele céu-azul-celeste, visto pelo foco dos meus olhos embaçados de amor.
Um amor que não existia, mas que mesmo assim, era saboroso.
A brisa batia com força na minha pela escura de sol, fazendo música de chuva caindo em manhã de domingo.
Fechei meus olhos com força, e quando vi, não estava mais ali. Nada disso havia acontecido.
Acordei feliz. Me vi sorrir.


C.

quarta-feira, 11 de abril de 2007

Fragmentos

Parece que agora a questão passou de vida ou morte por ter atingido minh'alma, por ter tocado no fundo, doído no fundo, e principalmente, por ter sangrado tanto.

Ainda sinto que não sou mais sombra dos dias, mas parece que meu corpo pesou, e sobre meus diversos sorrisos pousaram maripousas mortas pelo pecado. Pelo meu pecado.
E o que sobrou do meu coração, foi o caroço. Caroço daquela pêra doce e saborosa que comi rápido demais.

Fragmentos doloridos de um dia sem braços, sem pernas e principalmente sem olhos.


C.

Não é felicidade, é loucura.

oaiuepoiujoincuheghfhdeucheiudhjhbyagwsdbleibcaydbuaybjfhbkveycgecybjhvsbdoijeopijeibkveycgecybjhvsbdoijeopijei
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Me sinto assim, da altura do chão, cheio de incertezas. Foi como um disparo, como extase, inesquecível e duradouro por certo tempo, agora acabou.


D.

terça-feira, 10 de abril de 2007

... e estar cada vez mais orvalho. Não, sereno.

...

sexta-feira, 6 de abril de 2007



Esta é a minha forma de dizer.
N.

Abril

"Sinto o abraço do tempo apertar e redesenhar minhas escolhas.
Logo eu que queria mudar tudo me vejo cumprindo ciclos, gostar mais de hoje e gostar disso.
Me vejo com seus olhos, tempo espero pelas novas folhas. Imagino jeitos novos para as mesmas coisas, logo eu que queria ficar pra ver encorparem os caules.
Lá vou eu, eu queria ficar pra me ver mais tarde, sabendo o que sabem os velhos. Pra ver o tempo e seu lento ácido dissolver o que é concreto.
E vejo o tempo em seu claroescuro , vejo o tempo em seu movimento que me marcar a pele fundo, me impelindo, me fazendo. Logo eu que fazia girar o mundo. Logo eu, quem diria, esperar pelos frutos.
Conheço o tempo em seus disfarces, em seus círculos de horas, se arrastando feito meses se o meu amor demora. E vejo bem tudo recomeçar todas as vezes. E vejo o tempo apodrecer e brotar e seguir sendo sempre ele. E o tempo todo começar de novo, e ser, e ter tudo pela frente."

A doença.

Silêncio.
Vou tirar da minha boca quarenta motivos de dor.
Vou falar alto, bêbado de sonhos, todos os versos de poesia que me sorrirem. E depois, marca-los com meu nome, este nome que jogaram em mim.
Vou erguer meu queixo sobre o resto de minha nudez juvenil e deixar-me ser belo. Me largarei para beleza, esta, cujo tamanho e crueldade são ilimitados. Estarei possuído de mim, e me possuirei assim, morto, vivo, morto-vivo da vida morta.
Vou suprir as faltas com o prazer, me envenenarei de prazer. E, envenenado, louco, íntimo de minha podridão, morrerei, mas vou morrer de vida.




G.

quinta-feira, 5 de abril de 2007

Branca, Lua, Preta!

É assim, mais ou menos assim.
As pessoas se aquietam e ficam sóbrias, há um silêncio profundo nesse lugar. O barulho das árvores é como aquela velha música que toca na nossa vitrola, é, na nossa vitrola. É como se nenhum sentimento existisse aqui dentro de mim, como se tudo tivesse parado e eu estivesse apenas respirando e ainda trabalhando todas as articulações do meu corpo. É como partir e morrer. Não estar. Um dia nada. Um dia sem sentimentos, sem abraços, sem ninguém, sem melancolia. Não tendo pra onde fugir, muito menos onde se esconder, a não ser em si próprio. Naquele lugar que só você conhece, onde tudo pode, onde tudo é inocente. É verdadeiro.

A privada aqui é toda suja, com um fundo preto. Cheia de merda, cheia de vômitos. Das tantas coisas que cansam as pessoas, das tantas amarguras, das tantas inseguranças, dos tantos medos, enfim, dos tantos que não foram aproveitados, ou aproveitados demais. Tanta coisa já aconteceu e eu só vi passar. Nuvens de algodão, bolas de papel, pipas ao ar, pirulitos coloridos, mas nunca me deixei ser aquela criança, que sonha, que pensa no futuro, que tem como princípio, ser feliz, apenas ser feliz. Não, eu quis tudo ao contrário. Tudo errado? Não sei se errado. Pra essa sociedade podre, sim. Mas, para nós, não. É agora e é pra sempre. É como se estivéssemos aproveitando todos os momentos, como se fossem o último. É mostrar-se amigo, é ter amigos.
Eu tento fugir dos olhares do mundo, me esconder a todo instante. Não é bobeira, eles não aceitariam. Não é forte e nem oprimido.

Cada eco leva uma voz adiante. Qualquer traço, linha, ponto de fuga. Qualquer pedaço que se mova, qualquer.
QUALQUER COISA, ALGUÉM AÍ ENTENDE? É CANSAÇO!


d.

Desconserto em palavras.

A brisa do outono caia como luvas em cada traço marcante dos caminhos que vazia aquele corpo de menina moça. Abriu a janela pra sacada, e ficou ali por quase uma hora, analisando o poder da manhã de domingo. Analisando como as ruas eram pouco movimentadas nesse horário, nesse dia. Por pouco não escutava o grito sonolento de cada folha que despencava levemente das árvores, que pelo vento fraco da manhã fazia com que elas flutuassem mais ainda, naquele ar de areia marinha que não existia ali. Alguns passos apressados, alguns cachorros abandonados.
O sol brilhava feito aquele ultimo dia de amor em setembro, queimando por de baixo daquela pele fresca, cheirando sorvete de uva ao creme. Irradiando a face até que os olhos se apertassem e ficassem completamente pequenos, formando diversas caretas amargas. O céu transbordava dezenas de azuis escaldantes, e do lado direito às pintas da bochecha se confundiam com as últimas estrelas avistadas no céu. No céu de ontem.
Ela conquistava cada dó menor, cada fá sustenido e cada lá com sol, que vinha junto daquela canção antiga, dos tempos de cabelo comprido, dos tempos em que viver era só sonhar, daquele carro barulhento, cheio de fumaça de cigarro. Devia ser no vinte e quatro ou vinte e cinco que o volume abafava o som enfraquecido daquele solo de guitarra da música No Rain.
Lá de cima ela também avistava o vago da cidade, onde os lugares ainda eram cobertos daquele cimento verde, onde o orvalho cai todas as noites e molha. Onde antigamente ela colocava a toalha colorida para ficar dando nomes a estrelas que ela nem mesma conhecia, fumando um cigarro fraco e mergulhando em fantasias pré-históricas. Cheias de sabores freneticamente lambidos por sensações anestesiadas pela vontade de se afogar em um mar salgadamente doce. Até o dia nascer, até o sono bater. Sem ou com moletom, naquele cimento de antigamente, onde agora quase não tem espaços verdes, muitos menos verde-musgo.
Sentia saudade de lá enquanto o vento e o tempo passavam, como tem passado os anos, despercebidos. Rápidos demais. Com "para sempres" excessivos e sem sabores.
Fechou os olhos, bateu os pés, e quando abriu foi logo despistando o olhar daqueles pássaros que voavam para o país das maravilhas, longe daqui. Longe daí. Longe de mim. Longe de tudo. E principalmente dela.
Desceu as escadas e no jardim foi procurar flores que morriam e que nasciam por causa da estação. Borboletas circulavam entre suas cores fortes, e em uma dança típica de outono. O tempo foi passando despercebido outra vez. Encantando não só a ela, mais as pessoas que passavam na rua, e com olhos longos enxergavam cada passo flutuante que ela girava, naquela ciranda imaginaria, naquela corda-bamba invisível, em cada piscar demorado mexendo os cabelos cacheados de mel, envolvidos por fel. E entre a sombra e o amarelo brilhante, ela gritava um silêncio entorpecente de palavras cheio de enigmas lunáticos, como se resolvesse jogos de xadrez sem nem pensar. Ela flutuava com os pés no chão, mas como pipas longes, e coloridas de prazer pelo vento mais fresco e limpo de lá. Lá de cima. Lá do céu. Lá das nuvens mais altas. E do sol. E da lua. E da onde quer que fosse o pico mais alto o sorriso dela encaixava com cada centímetro de vida que eu ouvia a aurora nos dias de inverno, mesmo que o gosto fosse o outono.

Aquela bailarina com o doce de pele adocicando o ar, com as cores tóxicas do amor, do sabor, do prazer. Anestesiada de vida.

- Viver é não saber não rir.


C.

quarta-feira, 4 de abril de 2007

A verdade em branco e preto

Vejo as cores. Aquelas. Recheadas de mentiras sinceras, cheias de sorrisos largos, ora desconcertantes, ora desconcentrados. Vejo o céu – ah o céu. Alguém havia reparado na profundidade arrebatadora que possui o céu hoje? Roxo e vermelho. Dizem que roxo e vermelho é a cor da perdição. Roxo e vermelho. Quero é me perder, só para poder sentir a poesia errar de veia no ato de me encontrar. Perco-me entre as nuvens de baunilha do céu de Monet e me misturo no surrealismo ácido de Dalí. Danço feita bailarina torta por entre os caminhos de Oz, corro do monstro da torre do Orco, despedaço-me como pétalas secas sob o sol escaldante do meio-dia, e nasço, ou melhor, renasço no orvalho quente-frio de cada manhã. Sinto, agora, no silêncio da escuridão, o vento dançando, leve, sobre meus cabelos, me envolvendo, me desenhando, colocando em ordem frase por frase bagunçada entre meus versos aleatórios e sem fôlego.Perfeição beirando a não-lucidez. As cores. As brisas. As sensações.Sinto-me a protagonista de uma música do Chico. Roda viva. Ou quem sabe uma das mulheres de Vinicius. Isso. Sou a própria menina com uma flor. Flor de Lírio. Entro na sala de espelhos, olho para um deles e desafio a me amar. No frêmito entre uma respiração e outra, o cheiro de poesia misturado com o gosto do álcool, preso como unha e carne entre os meus lábios, se desenrolava, breve, sobre o meu corpo. Sentia cada fisgada, amarga, de prazer. Sentia cada dor, pura, do à-flor-da-pele. Sentia cada gota d’água, uma por uma, transbordar além do acima do além sobre mim. Morro de vontade, seco de desejo e ardo. Dói-me arder toda. Mas é doce sentir o arder. Então ardo. Transbordarder.

Vejo os tons coloridos, todos em preto e branco. Sorrisos contraídos e contrários. Vejo o céu, metade cinza. Quantos versos vazios serão precisos para me fazer espatifar no chão como Lolita após escutar todas as manhãs – luz da minha vida, labareda em minha carne? Tão vazio, tão fundo-sem-fundo. Me vejo no reflexo do olhar de Monalisa, e me reflito junto ao seu abstrato perdido em algum lugar que eu não sei onde fica. Os milhões de vasos sem nenhuma flor padecem sobre minha varanda cercados da imensidão vaga dos vaga-lumes. Sento naquele balanço, já velho, e fico vendo o tempo passar feito um cigarro queimando, vendo a vida escorrer feito aquela gota d’água que um dia transbordou em uma rima, ácida, nas minhas profundidades. Não há lírios. Há só alguns vestígios, tão pequeninos, de poesia que ás vezes aparecem em um ruflar de asas de borboletas, perdidas, no meu estômago.
De toda aquela coleção de eternidades pífias e semi-puras que possuíam aquele gosto eterno de nunca e de pra sempre - meio-doce meio-amargo - a única que ainda está aqui, intacta, é a sala de espelhos, onde eu me olho, enfrento-me, quase me ardo, que me deixa muda - de corpo e e de alma - apresentando-me uma nova versão, rude, da mesma coisa. E tudo o que eu consigo enxergar é uma uma mancha desfigurada, das cores, daquelas cores, minhas, de Picasso, talvez de Tarsila, cores de Frida Kahlo, todas - pasmem - em preto e branco.

Open your eyes;




L.

Contato Imediato

Peço por favor, se alguém de longe me escutar, que venha aqui pra me buscar.

Me leve para passear no seu disco voador, como um enorme carrossel atravessando o azul do céu até pousar no meu quintal.

Se o pensamento duvidar todos os meus poros vão dizer: Estou pronto para embarcar sem me preocupar e sem temer.

Vem me levar para um lugar, longe daqui. Livre para navegar no espaço sideral.

Porque sei que sou semelhante de você. Diferente de você. Passageiro de você. À espera de você.
No seu balão de são joão que caia bem na minha mão, ou numa pipa de papel me leve para além do céu.

Se o coração disparar quando eu levantar os pés do chão, a imensidão vai me abraçar e acalmar a minha pulsação

Longe de mim. Solto no ar. Dentro do amor. Livre para navegar. Indo para onde for o seu disco voador.




Arnaldo Antunes /Marisa Monte /Carlinhos Brown.

C.

Carta resposta aos amantes da melancolia

Eu espero sinceramente que por debaixo dos olhos tristes e do sorriso ausente escondam-se infinitos prazeres, e que nos paradoxos doloridos estejam os abraços mais acalantadores.
O acalanto do aventureiro é a aventura.

Nos sonhos cheios de adrenalina com cores do país das maravilhas, Alice grita do inferno de si mesma, pedindo socorro à quem sonha: "Liberte-me da segurança do que conheço!!"

Conheçer-me de nada vale, a não ser evitar a surpresa da temível loucura.
Enganar-me é não saber até onde vou? Enganar-me é acreditar que este limite possa existir.

Talvez seja hora de desistir. Desistir de encontrar o ponto em que a fruta se despedaça, se revela, e morder, estuprar sem pudor a si mesmo. Gastar-se com o gosto de quem morde a própria pêra, de quem não tem medo de ter fome.



E ao ter fome, coma o que tem: A fome.


G.

Trancafiança

O duro desses meus pensamentos nublados e quietos, é que dentro de mim eu me fecho. Crio barreiras. Me torno invisível.
Para mim não adianta mais fechar os olhos com força, fazendo pensamento para que tudo volte ao normal. Não, não adianta mais. Meus pés não saem mais do chão com tanta facilidade. Eu não voou. Eu não flutuo mais dentro do mar-de-rosas-lilases-com-cheiro-de-purpurinas-brilhantes.
Me afoguei depois de um dia cansativo de tristezas no meu quarto escuro, fechando a porta para o mundo. Joguei minhas dores nas almofadas e junto delas saíram algumas lágrimas involuntárias. Eu adormeci em um sono fundo e pesado, sonhei com coisas inexplicáveis e acordei sorrindo.
Depois desse dia cansativo de tristezas, eu passei a todos os dias ter dias iguais. E dia após dia fui enferrujando meus lábios de álcool, enferrujando meu sorrido avassalador, enferrujando meus olhos-com-brilho-de-quero-mais, enferrujando meu jeito e o meu não-jeito. Não dei conta de mim, e agora vi o tanto estou perdida. Com medo até da chuva que pode cair lá fora e que à tempo não vejo. E que à tempo não saboreio.
As músicas não fazem mais sentido algum. Nenhum som ecoa nos meus ouvidos dançando. Nenhuma borboleta colorida samba em passos firmes dentro de mim. Nenhum gosto doce vem a minha boca quando lembro de alguém.
Ouvi dizer que quando não se suporta mais o cheiro, o amor também não suporta mais nada. E foi exatamente assim comigo.
Não me fiz forte o suficiente para que minhas narinas respirassem aquele cheiro-forte-azedo-enjoativo-e-obscuro, e me afoguei em um jogo chamado quebra-cabeça-do-adeus. E com o passar dos dias, eu aqui, trancafiada dentro do meu quarto vago, cheio de promessas para o futuro que não existe, cheio de fotos antigas carregadas de saudade vazia, cheio de mofo limpo com gosto de chuva ácida, cheio de dores compostas, cheio de roupas coloridas para um dia chamado nunca mais. Cheia de tempestades de sol no escuro.
E completamente ou incompletamente cheia-desses-dias-sem-amor.




C.

terça-feira, 3 de abril de 2007

Sempre soube.

Cadê a minha vala? Meu fundo do poço?
Cadê o meu caminho? Meus muros? Minhas mentiras?
Onde estão as minhas desculpas, os meus anseios?
Quando foi que esqueci que deixei tudo para trás?

Se antes eu me perdia na mentira, agora não me acho na verdade. Não me enxergam nela. Ela se vinga de mim dissimulando e mentindo descarademente, assim como eu, que um dia cansei de mentir usando apenas verdades dissimuladas.

E eu me vejo na beira do precipício outra vez, aquele que todo mundo fala, aquele que todo mundo quer ter pra si mesmo que seja pra dizer que não sabia se pulava ou se dava meia volta, aquele que um dia eu pulei, que jurei nao querer ver na minha frente. Tudo porque eu não pulo pra cair. Mas sempre caio.

Esse é o meu karma, essa é a minha sina.
Mas esse é o precipício da contradição, o desejo de todo suicida arrependido, inclusive o meu.

S.

segunda-feira, 2 de abril de 2007

Efêmera Existência.

Muitos passavam e nem sequer a percebiam, envolvidos em seus dramas particulares ignoravam o fortuito e se casavam com o óbvio para se tornarem um pouco mais egoístas.

Já nao se sabia o que era o que, não se entregava totalmente mas ali permanecia, se desmanchando com o passar das horas, se desfazendo com o sopro do vento e com o calor do sol, ansiando em ser o que estava estampado na sua cara, ou não.


Sabia que seu tempo era contado, ela era mais uma daquelas que nasceram para morrer, daquelas que ficam agonizando seus dias porque sabem que no final não fica nada pra contar história e porque nem suas próprias histórias podem contar.

Então ela se deixa levar, se deixa secar, se deixa morrer esperando que ninguém lhe pise na cara ou em qualquer outro lugar que a faça desaparecer mais rápido.

A sarjeta é sua melhor amiga e sempre será, ela sim sabe das coisas, sempre esteve onde está e já cansou de ver muitas outras com esse mesmo destino.

Destino cruel de nascer, mal viver e já morrer.




S.

domingo, 1 de abril de 2007

Amores e desejos líquidos

Noite quente. Meu coração – congelando. Como sempre. Como nunca. Naquele compasso lento e depois rápido que faz as pernas bambearem de vez em quando e o ar fugir do pulmão para algum lugar que eu não sei bem onde fica.
Eu precisava dele quente. Sete vezes quente – o coração. Eu precisava sentir o vento do outono e ver, plena e breve, as folhas caindo conforme o balançar das árvores. Eu precisava desprender desse gosto de morangos mofados que não possuía só a minha boca, possuía o meu corpo todo, e a minha alma – o que é mais difícil. Desaprender. Só pra sentir aquele cheiro de frutas frescas misturado com margaridas, que só a aprendizagem por inteiro tem, mais uma vez. Mas precisar é vago. A gente precisa de um monte de coisas todo a hora. Precisar. Verbo intransitivo. Preciso de alguma coisa. Alguma coisa diferente de todas as outras algumas-coisas que eu já ousei precisar – mas nunca tive – antes. Mas não sei o quê é. E preciso sozinha, eu e minha outra metade – minha – perdida por aí sambando em passos breves.

Na mesma noite quente, na mesma saudade apertada – e apertando – de alguma coisa que eu nunca conheci, na mesma angústia insolúvel procurando se difundir por entre as palavras soltas no vento seco, quase parado... eu a encontrei. Não a minha metade. Ela. Quando a vi, atravessando a rua, meio-vergonha meio-vontade, se ajeitando toda para se esconder depois por trás de toda aquela profundidade funda-sem-fundo, lembrei na hora daquele trecho do caio que dizia –Alfa é meu nome. – Esse é teu nome de guerra? – Não, esse é meu nome de paz.
De paz. De paz. De paz. De paz. De paz. De paz. De paz.
De repente eu enxerguei.
Era disso que eu precisava. Só disso.
Eu enxerguei sossego nos olhos dela. – Ah, aqueles olhos! Tão negros e tão profundos.
Foi muito. Muito pra pouco ou pra quase nada. – Sempre assim.
Um dia, uma noite, um dia, uma noite. Nada mais doía, nada mais latejava, éramos nós. Eu e ela. Amores e desejos líquidos. Devassou-me.Tirou-me de mim antes que eu mesma me tirasse. – Não de mim, dela. Desbravou cada fiapo perdido de dor antiga, e depois os arrancou, um a um, bem devagarinho pra eu não ficar me doendo ao seu lado. E eu não ia ficar. Não ia. Nunca. – Mal sabia ela. Depois derrubou meu muro e o fez parecer tão pequeno que quase beirava uma ilusão. E talvez realmente fosse.
Era aquela sensação. Aquela. Que todo mundo fala, fala, fala, mas que quase ninguém sente. E eu sentia. E não precisava saber o que realmente era pra saber que eu sentia. Sentir é diferente de precisar, não é limitado. É o ápice do prazer antes do transbordar.
Acordei com gosto de hortelã e alecrim na boca. Senti todos os seus gostos, seus cheiros, cada pedaço de pele e cada cicatriz escondida por entre cada curva. Eu a sentia. Sentir alguém é sete vezes melhor do que se sentir. Agora eu tinha certeza.

Teria sido a noite-dia-noite-dia mais bonita de todas as minhas vidas. Vidas no plural porque uma não me basta. Preciso de várias pra ser tudo o que eu quero ser, nesse quadro de paradoxos frios e contradições. No final, tenho tantas e acabo só vivendo uma. É burquesa até mesmo a nossa busca pelo transbordar-pequenas-porções-de-ilusão. Deixei de lado todas as milhões de outras vidas cheirando a mofo, cheias de sonhos ruins e com aquele gosto amargo de metade cansada. E fiquei só com essa, a minha, essa com o gosto daquele sorvete azul, que eu adoro, e que você aprendeu a gostar comigo, essa que possui todas as cores de infância que na verdade eu não me lembro bem de ter visto, essa que possui todo esse aroma fresco de amadurecimento necessário que só os lírios conhecem realmente. Essa, que é para ser vivida, transbordada e digerida, sa-bo-ro-sa-men-te.

Teria. Teria. Teria. Teria. Teria. Teria. Teria.
A vida escorre - devagar - em copos de cerveja, o tempo corre enjoadamente como em batidas cansativas de ponteiro de relógios. Há histórias, amores, gestos e toques que são reservados apenas para dias específicos. - Uma pena que tudo, hoje, não passe de uma mentira sincera de tudo o que a gente sente, sonha e idealiza, de toda a nossa essência - perdida - por entre as rimas tão fáceis e tão verdadeiras por trás de todas aquelas entrelinhas. É realmente uma pena.


Corre, tenta não pensar. Corre de novo. Mais uma vez. E de novo. E mais trilhões de vezes de novo até sentir seus pulmões pulsarem junto do coração, procura lábios de álcool, poesia – amor- mas não tem jeito. É sempre assim. Desse jeitinho assim. Trágico e pleno. Mas doce. Sete vezes doce.

L.

Primeiro de abril de dois mil e sete.

Mentira.
pode abrir os olhos agora.
se voce continua a ler esta frase é porque continua de olhos fechados.

Estou te contando, voce vive mentira. Abra o olho, voce sequer viu a vida. Cada letra, cor, número - cada cheiro, textura, pensamento, idéia, sentimento, sensação - cada realidade, cada irrealidade - todas as bizarrices e normalidades, todos os delírios é sobriedades - TUDO, repito, tudo, não passa de sombras.

Abra os olhos para ver a luz que provoca a sombra.
Ou viva sua mentira.



G.

No outono mariposas maripousam no chão.

Quantos versos soltos, quantos beijos poucos hão de ser pra mim?
E quantos dos tantos rostos, dos sorrisos foscos vão me dizer sim?

Quem vai me seguir?
Haverá um espião maluco a me espionar por entre arbustos secos, e janelas altas?
Haverá um amante tímido, que, ao se fazer vento, me abraça em cada tempestade?


Não é no rosto de um só espírito que me encontrarei em amor.
Meu amante está nos olhos das asas de cada mariposa, no cheiro da rua, e no olhar de todas as mulheres (as com seios e as sem seios). está na boca de cada homem, e nos seus dentes, e nos seus braços.

Meu amor é o amor roubado do todo, e de tudo que há no todo.

(o ar em minha volta é vazio, e meu.)




G.