sábado, 26 de maio de 2007

Fui flor em outra vida

O que você foi em outra vida? Essa questão sempre vem à tona em algum momento. Vai me dizer que você nunca pensou nisso? Claro que pensou. Todo mundo pensa. Eu já cheguei a achar que essa é a minha primeira vida, porque é torta demais pra já ter experiência. Mas mudei esse conceito quando meu médico homeopata, que digamos é um pouco mais espiritual que os outros me disse em uma das consultas em que eu estava ansiosamente aflita, mexendo o pé pra lá e pra cá, querendo contar milhares de coisas em duas frases pra que coubessem no tempo curto: – o lóbulo da sua orelha tem um formato peculiar. Você foi feliz em outra vida.
Quer dizer então que além de eu ter tido outra vida, eu fui feliz nela. Coisa que me parece meio complicado de entender tendo em vista essa fase sem-sal sem-açucar em que me encontro no momento. E que coisa é essa de felicidade, ser feliz e etc? Ninguém é totalmente. Ninguém. E quem disser que é está mentindo. E pra piorar meu lóbulo tem um formato peculiar(?). E que tipo de coisa é essa de ver vidas por lóbulo de orelha? Vai entender. Mas eu tive outra. Ele disse e eu acreditei.
Fiquei horas pensando nisso hoje à tarde. Eu não acredito muito nessas coisas de outra vida, cosmos, energias misteriosas, ou outra parafernalha-qualquer que não faz a mínima diferença pra ninguém. Pra falar verdade em energia em até que acredito. O bastante para eu querer entrar urgentemente na yoga para equilibrar as energias internas. Mas isso passa, juro que passa. É só reflexo da minha fase atual de tpm sem estar na tpm. Vai passar.
Passei o dia todo pensando nisso. Que diabos eu fui nas outras vidas? Um gato talvez. Eu ia gostar de ter sido gato. Mas acho que vou deixar isso pra minha próxima. Cachorro não, eu gosto mas não pra me ser. Passarinho então, de jeito nenhum. Mania chata essa de voar nas pessoas. Insetos e o filo artrópoda de modo geral nem pensar. Tenho asco de tudo o que voa e faz aquele barulhinho inusitado quando é pisado – crac – Esse mesmo. Não é a toa que eu tive arrepios da cabeça aos pés lendo paixão segundo G.H. Clarice que me desculpe, mas esse não me deu. Morria a cada linha. Realidade é amarga demais sabes?! Sei que sim.
Voltando ao ponto inicial, passei o dia todo pensando o que fui eu em vida passada. Número um: Tinha que ser feliz. Isso é difícil. Ainda mais pra mim. Dorzinha, dorzinha... Se eu não gostasse tão sufocadamente, acho que ia começar a fingir de tão colorida-dolorida que ela me parece. Acho que só o número um me basta. Na verdade me basta porque não me veio nada além dele em mente. Mas pensando bem, quer coisa mais complicada nessa vida do que isso? O poetinha vagabundo já dizia “É melhor viver do que ser feliz”. E se ele já não tivesse dito, um dia com certeza eu ia dizer. Se eu tive vida passada, logo eu vivi duas vezes. A passada e essa. E fui feliz em uma só, na primeira suponho. Nada mais justo. Não é a toa que o peso do sobrenome ficou pra essa. E que peso.
A questão é que eu tive um insight. A questão não, a resposta da questão. Flor. Claro! Não querendo contar vantagem ou algo assim, e quem entende de flor vai me entender também, mas eu fui flor. Não tenho a mínima dúvida disso. Flor. Não me pergunte que flor, porque aí você já está querendo demais. Isso até passou pela minha cabeça. Sobre o tipo de flor eu digo. Margarida talvez. Lírio de jeito nenhum. Lírio é a minha flor preferida, mas eu não vou me enganar achando que fui lírio. Não fui e pronto. Rosa talvez. Daquelas bem altas. R0sa-cor-de-rosa. Não. Muito rosa pra mim. Acho as vezes que eu tenha sido uma flor de erva-daninha, daquelas que se agarram à beleza de todas as outras coisas para se sentir grande, graaande, graaaaaaaaaaaaaaaaande, e quando você menos espera tomou conta do jardim todo. Estava quase certa de que eu era essa. Mas não, felicidade não é isso. Não só isso.
O nome da flor talvez seja o que menos importa. As flores são pessoinhas maravilhosas e de uma pureza inigualável. Elas sentem dor como nós sabiam? Sentem sim. Sentem dor por elas, pelo jardim e pelo mundo todo. Se doem inteirinhas. É por isso que às vezes elas murcham e às vezes se enchem de vida. Não se engane achando que é no murchar que mora a dor. Muitas vezes é no se encher de vida. Isso dói. Dói, dói.

Fico feliz de ter sido flor-sem-nome em outra vida ou qualquer que seja o nome disso. Mas uma coisa ficou errada na história. As flores são felizes e infelizes ao mesmo tempo. Porque são solitárias. E as pessoas solitárias são assim. De qualquer forma, fui flor. Não inteiramente feliz, mas fui. Quer coisa mais bonita nessa vida (ou em outras) do que ser flor? Qualquer que seja. Fui. Tenho certeza. Não achem que eu estou louca, por favor. E nem duvidem da minha essência já vivida. Fui flor e ninguém tira isso de mim. Nem você, nem você e nem você. Pensando bem, talvez eu seja flor nessa vida também. Vai saber.
Só sei que hoje o dia está em um cinza terrivelmente ardido, quase insuportável, e não poderia existir dia melhor para isso. Para viver isso.
Com todo esse papo de flor, não sei se o cheiro que sinto agora é das margaridas brancas que estão em cima da mesa ou de mim. É que o jardim cresceu em mim de um jeito tão imensurável que eu deixei de observar o jardim e passei a ser o jardim. Ser já, jardim. Cheinha daquele colorido-dolorido que eu adoro. Flor na outra vida, jardim nessa. É isso.

Só me resta dizer agora, que te vejo em outra vida. Quando formos gatos.





L.

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